terça-feira, 14 de março de 2017

CONTOS MEMORIAIS - CONTO 3

                                                                    CONTO 3

Frutas produzidas no vale irrigado caiam do céu para boca de famintos como luz multicolor quando ilumina quem vive em tempos de cratera de trevas. Nos períodos de safra frondosa, ah, que delícia! a fronte dos moradores das áreas rachadas pelas estiagens ganhava botox natural, o cosmético mais empregado hoje para esconder as rugas de quem tem, na vaidade, o vício de se esconder do tempo.
Matava fome de meninos quando estes pulavam cercas e usavam do impulso das pedras para derrubar frutas ainda madurando no cacho. Um olho na fruta, outro no dono do pomar para fugir de bala de sal disparada por munição de espingarda de socar.
Alimento bom trazia as frutas sertanejas pro buxo, sustança elementar pra continuar sonhando o homem com céu escurecido e o ronco dos trovões acompanhados de claridades passageiras pelos relâmpagos crepitantes.
Espigados coqueiros produziam bola verde pra matar a sede de menino arteiro e de adultos famintos. Era um refrigério animador a melhor água doce de coco do sertão, quando descia pela goela em dia de sol a pino, com suor escorrendo pelo corpo, produzido por seguidas brutalidades de braços sacolejantes nas enxadadas na terra.
De barriga cheia, bola chutada era as de meia no terreiro de casa de taipa sua ou dos vizinhos.
De capotão em campo de terra brincavam de quem fazia mais goools em traves com trevas nas armações de pedra, de touco de madeira sem lei. Os dedos dos pés dos jogadores mirins correndo atrás da pelota, se lesionavam com farta facilidade pelos tocos e pedras serem chutados no lugar da bola.
Água de coco nas sedes das estripulias matava  desejo de meninos nos pomares, que nasceram por mãos de funcionários da vila de terras públicas. Quando o inverno surgia, era uma festa, sacoleja a esperança de banhos demorados. Saiam os meninos nadando arrastado pela correnteza do rio, canais de irrigações eram frequentados para brincadeiras demoradas, do trampolim improvisado da galeria, pulava de ponta rapazotes mais afoitos. Perigo a vista de ser puxado por redemoinho formado acima da comporta sugando água que enchia os canais.
Água do açude era entregue à população da pequena vila de funcionários públicos, em canos de aço enferrujados. Entrava nas casas derivada de grande caixa d’água pendurada num despenhadeiro.
Lembra do dizer dos mais velhos que a água era boa não só para beber, servia como xampu, a de coco, a água renovada do açude em reboliço, podia trazer para as tripas, o vibrião da cólera. Tramóia! Dava cabelo endurecido pelo açucarado doce sabor, a de coco. Pente não penetrava. Só quando forçava o garfo de madeira com raios de bicicleta, pelas entranhas do Black Power dos anos de irreverência dos setenta.
Fiapos de manga do vale irrigado se metiam à besta, se embocando entre dentes.
Aja palito de lascas de capim pra socar entre um e outro, e tirar o cabelo pelo da manga espada, coquinho. Manga rosa, bem vinda era a popa. 
A menina Rosa fazia um bem dos diabos, alimentava a fantasia, aquecia a energia da juventude espoleta procurando se aventurar em busca dos primeiros amassos, depois de experimentar os iniciais goles de cana pitu nas beiras dos canais de irrigação, embaixo das moitas de avelozes.
Suco adocicado de manga chupada com prazer de olhar perspicaz na próxima, não exprimia careta. Da Rosa o riso tímido alimentava moleque, seu beijo dava efeito de acelerar o coração. Lembra o menino arteiro de quando moleques de cócoras, esperava vento no galho que a manga derrubasse, enquanto o outro o galho balançava, sonhando com a presença de Rosa alargando o sorriso o convidando pra se encontrarem  na praça, bem longe de olhares guardiães e da TV que mais chiava que falava, bem mais chuviscava que mostrava imagens definida.
Enfeitava a vida de fartura nas safras as frondosas árvores.
Enfeitava a alegria a Rosa rebolando com trouxa de panos para lavagem na cabeça, com a mãe à frente gritando. “Rosa, peste de minina, anda adespressa, tá ficando muito pra trás, é tarde!”
Passarinhos vigilantes cuidavam das frutas para bicar e papo encher, com elas ainda sem por toda amadurecer.
Meninos parrudos cuidavam da Rosa em formação para beliscar atenção pra pensamentos sobre amor e sexo nas macegas.
Era bom, lembra o moleque!
Disputava com quem tinha mais fome de amor e comida como os homens já crescidos.
Das pinhas e graviolas se comia até o caroço, por ser alongado pequeno e não roliço nem grosso, deslizava fácil pela garganta e não entupiam como as goiabas.
Amadureciam por debaixo de capim amontoado, frutas como abacate, pinha, graviola. Frutas esquentavam a polpa no calor, amoleciam mais cedo pra festejo de menino que tinha pressa para a fome matar.
Apetite de moleque em crescimento, não esperava tempo aberto fazer amolecer a polpa inteira de frutas do  viveiro de experimento agrícola, como os cajus, abacates, seriguelas, cajaranas, cajás e  umbus.
Tangerinas eram furtadas por bandos de moleques, em sítio afastado dos guardas do perímetro, sempre salientes no experimento de entregar os moleques pra família dar um corretivo de cipó de marmeleiro, quando o pai não tinha verba pra retirar o cinto do cós da calça.
Se demorasse derrubar do galho curvado pelo peso da boa produção, espertos com mais força na fome e na envergadura, chegavam pra comer fruta primeiro que menino arteiro.
Lembra dos canais de irrigação que nos invernos deixavam de produzir lágrimas nos agricultores e saíam abundantes despejando fertilidade nos campos sertanejos formados por várzeas de terra fértil.
Enfiava gosto pular de ponta de ponte de tábua, dando cabeçada  n’água em correnteza, com certeza. Diversão danada de boa sair nadando debruçado arrastado pela correnteza do rio temporão, flutuando deitado em pau de bananeira,  bóia de câmera de caminhão, vigilante no céu alumiado de calor feito braseiro do Senhor, levado mais adiante de encontro aos braços do guarda-civil  Bico-de-Aço.
Lembra, porém, dessa beleza de existência, apenas quando as chuvas se faziam presente e despejavam as sobras do grande açude pelo sangradouro, parando de sangrar os olhos dos agricultores e dando viva aos peixes.
Otoridade civil entregava moleque para os pais pra correção da malinação nas correntezas do rio e canais em ação de escorrer água nas invernadas.
Lapadas de cinto de couro cru no traseiro ou cipó de arbusto que desse pra mão quebrar, visitavam espinhaço a qualquer hora da ditadura dos pais, apois seguia a risca a ditadura militar, quando moleque não possuía ainda pernas-pra-quem-te-quero e corria feito potro brabo para diversão em busca dos braços da vó.
Vixe! Como era bom o sertão quando chovia de montão!
Vixe! Como era triste o sertão quando fazia seca de arrastão!
Das goiabas novas no verde do cio, reclamava moleque pra mãe que não conseguia cagar, tava entupido pelo excesso de caroço hostil.
Das muito maduras nem espiava por dentro moleque faminto. Eram devoradas no desarvoro mastigar quase não. Não via bicho mole se mexendo do tipo tapuru de fruta.
Horror aos bichos só delegava às vistas, quando era produzido nos restos que os urubus não conseguiam devorar dos animais mortos pelo estio.
O sertão dá e tira desde tempos imemoráveis, ouviu o menino esta frase muito dita pelos mais velhos embriagados por contar sobre o passado hostil do sertão, já contidos pelo aproximar da morte, apois que morriam desde que nasceram pras bandas de  terras distantes mais secas que molhadas. Em muitos, lágrimas de despedidas corriam pelos escovados canais do rosto, vindo sentimento aflorar devido saudade boa ou ruim do passado que migrara com mais afinco para o presente.
Os homens faziam cruzes com os dedos indicador das mãos, para afugentar o demônio da seca. Era lembrado ou citado por alguém adepto do imprestável, nas rodas de conversa dos mais velhos olhando para o céu em adivinhação, se o inverno seria bom ou não. Imagens que até hoje continua gravada na cachola de menino.
Com inverno ou não, ciriguela das verdes exprimia careta na cara dos apressados em chegar primeiro que os adultos. Subiam nos pés que curvava os galhos para o chão, pela fartura a cada entrada de ano tão esperada. Os umbus não deixavam faltar outra face nos sujeitos proprietários de muita fome, por colherem ainda verdes frutas temporãs produzidas em terras sertanejas. Sangrava boca de saliva as tangerinas do viveiro, por também não esperarem o amadurecimento dos frutos cajá, cajarana.
Derribava de galho moleque mais crescido, essas árvores que davam fruta, e se partiam inteiro com o peso dos meninos em crescimento.
Os adultos diziam pra ter cuidado com elas, não tinham trançado na matéria madeira como as goiabeiras resistentes, nem iguais eram aos homens que lutaram na guerra de Canudos.
Juá o menino não gostava de provar, em boca disponível pra qualquer alimento em qualquer tempo. Não tinha muito que mastigar a fruta da árvore sempre verde, perdido no esmo da mata calcinada. Sua polpa poupava a fome, por ser maior o caroço que o gosto. Sombra para o descanso de corpo estorvado pelos solavancos das ferramentas que volviam a terra para o plantio depois do estio era graça para os bóias-frias.
Cassacos da emergência da seca e agricultores das vazantes penavam quando um juazeiro por perto não existia. Eram procurados por  estarem sempre fechados no trançado das folhas verdes. Dele valia a casca raspada para escovar os dentes, depois de comer mais vento e sol que sustança sólida, os trabalhadores do eito.
Eita febre fibrosa que atacava sentimento de homem, já pensando nas plagas distantes que desse para viver sem o medo da fome.
O sertão imprimia medo ao homem, da fome.
Das mortes matadas, não.







Nenhum comentário: