terça-feira, 11 de dezembro de 2007

DÚVIDAS 
Quero chegar a ti Talvez
Para pô-la entre os espaços Do meu ser vazio
Através da linha do tempo

Ele será a via espiralada Quiçá

Entrecortada por muitas nuances 

O formador do caminho mais curto

Por acaso não

Pelas minhas certezas não possuírem

A sutileza do fluxo sanguíneo 

Que corre num moço vendendo saúde 

E que nasceu para não ter dúvidas

Minhas certezas

Se as tenho 

Porventura

As gaivotas roubaram 

E balança hoje nas ondas 

Do meu mar vazio

Quem sabe

Sejam respostas sem continente povoado

Parado no tempo espaço 

Que ignora a verdade 

Mim deixando cheio de dúvidas

Talvez...

terça-feira, 20 de novembro de 2007

A PORTA


A porta que se abria e se fechava
A porta que recebia e despachava
A porta que queria ficas mas se mandava
A porta que fazia que era mas se enganava
A porta que se olhava mas não se via
A porta que despedia e contratava
A porta que fazia entrar para ficar
A porta que fazia sair pra não voltar
A porta que era torta e se aprumava
A porta que de dia se levantava
A porta que de noite se abancava
A porta rota que dava rota à perfeição
A porta de vidro que não via quem era quem
A porta opaca que via muito quem era quem
A Porta que se abria para as traições
A porta que se fechava para o amor
A porta que não era porta mas se fechava
A porta que não era porta mas se abria
A porta que não tinha olhos mas que via
A porta que tinha olhos mas que não via
A Porta torta que dava reta a porta certa
A porta sem porta que vivia escancarada
A porta que se fechava batendo na cara
A porta que se abria para os bem vestidos
A porta que apartava pelas caras e cores
A porta que travava as buscas dos entendidos
A porta que destravava as buscas dos desentendidos
A porta que escolhia quem para passar
A porta que reconhecia os donos da maldade
A porta que reconhecia os com dom da bondade
A porta que se trancava para prender
A porta que se abria para libertar
A porta de madeira de lei que não via a lei

Há porta para toda gente
Há porta que não é porta por deixar passar
Há porta que é realmente porta por não deixar entrar
Há porta que não entende ser por viver fechada às novas idéias
Há porta que se acha muito “A porta”
Há porta que se engana mas que se acha está correta
Há porta com cara de tonta mas que é santa
Há porta que não seria porta se não se fechasse
Há porta que não seria porta se não se abrisse
Há porta para todos os gostos
Há porta que nos leva ao céu
Há porta que nos leva ao inferno
Há porta em direção a qualquer lugar

A porta certa é só procurar que existirá
A porta sem porta não seria uma porta qualquer
A porta sem porta seria a porta aberta
Que deixaria passar quem anda atrás dos sonhos

José Marques Sarmento


segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Um Velho Safado

Este é um conto safado, um tanto escatológico, quase nelsonrodrigueano

Há um tempo onde tudo termina, pois não é? Ah, se não é!
Para animais que leva na parte superior do corpo, órgão que a natureza deu-lhe para poder pensar o quanto quiser e o que achar, não poderia ter nascido para outra função, ser superior aos demais bichos da natureza.
Animais racionais como nós, por mais que o corpo perca a condição do que foi feito para fazer e resistir e sentir, massa craniana é componente sem reposição por parte da medicina, mas que pode viver até o apagamento total sem drama ou com, sem amor ou com, se compondo de sabedoria ou ignorância.
Era o que acontecia com o velho Laza, chamado assim pelos mais íntimos nos negócios que empreendia, Lazinho pelas mulheres e, pelos inimigos de concorrência profissional, filho da puta de quinta grandeza.
Coroa muito esperto, que ao longo da vida pôs muita lucidez peculiar para qualquer situação na massa encefálica, que se não fosse pela doença, estaria fazendo e acontecendo ainda.
Mal que o pegou de uma hora pra outra e o pôs sobre a cama, encontrando apenas condição de se mexer um pouco aqui, um pouco ali, por não encontrar condição humana de se locomover com maior ou menor velocidade. Movimentos bruscos por parte de algum membro exterior, eram acontecimentos do passado, perdidos há pouco tempo pelo coração ter dado um basta ao bombear sangue importante para as regiões que precisam ser visitadas de instante a instante.
Viveu muito o coroa Laza, o quase morto já, o que esperava a vela ser acessa diante a morte que não tardava levando os últimos suspiros e ser puxado para o andar de cima pela luz encarnada das trevas que ninguém em sã consciência quer, ou azulada como luz de HMI em espaço que ninguém veio contar como é, mas que dizem os espiritualistas que existe e que todos desejam.

De todos os fatos que passaram pela vida agitada que levou o acamado Laza, o que mais marcou foram àqueles relacionados às mulheres.
Vixe Maria! Eh mulheres luminosas que me encantou com a formosura, com os declives e aclives do corpo e com as sutilezas dos lábios que ferviam enquanto a quentura do corpo fazia elastecer os dias sem ser por arrasto, esses se descortinavam com prazer, que muitas vezes eram curtos para tantos encontros de negócios e amores.
Muitas delas passaram pelo seu desempenho de bom amante.
Foi homem fogoso em tempos idos, tempos que só estão guardados na velha lacuna cerebral, escondido por entre encadeamento de tecido que um dia fora regado com mais vivacidade, mas que, por esses dias, anda desencorajado pelo escasso bombear de sangue do coração para todo o corpo.
Andando pelo glorioso passado de homem de posses, com poder para fazer e desfazer a qualquer hora, foi muito visitado por diversas delas, desde louras a morenas, de japonesas a africanas. Gostava de experimentar todas as raças e teve que com isso conviver com a esposa que nunca veio a descobrir se era verdade ou não o que falavam nas rodas sociais a esse respeito, ou se fazia de desentendida, para não pôr a perder a firma. Achava que casamento é uma firma aberta a dois e que tinha que durar até o fim ou até deixar de dar lucro, como decorriam bons lucros financeiros na relação, na certa se fazia de desentendida.
Laza sente que ainda está vivo quando saem dos pensamentos os acontecimentos surreais pelos quais passou em convívio com as moças.
Viveu intensamente o coroa, mas por esse tempo de en-treva-mento dos órgãos, menos do cérebro totalmente, ainda encontra nele o refugio para se dizer vivo.
Essas horas quem o cuida divisa com um sorriso tímido. Hora dos sonhos sobre viagens pelo corpo das moças que conseguiu possuir até onde pode, dá satisfação, vindo a calhar de ser endereçada as carnes dos lábios.
Nunca deixou de trabalhar para quase todo dia ter uma mulher diferente da sua verdadeira na cama. Encontrava muito fácil essas mulheres. Com o poder que tinha, muitas ficaram esperando namorar-lhe, e envelheceram, assim como ele, com a esperança de um dia fazer exercer o desejo de se deitar, se deitar não para dormir, mas para fodor.
Sonhando como sonhava nas horas propícias dos dias viajando ao passado, tinha momentos que verbalizava palavras de entusiasmo para com as moças que se atiraram um dia sobre seu corpo.
Aí meu bem, aí é bom, como você trabalha bem, você é a melhor que eu já tive.
A mulher do momento se entusiasmava e lhe dava o que ele mais gostava que elas fizessem.
Tempos bons que se foram voltava tão somente nas viagens que a cabeça ainda conseguia passagem gratuita para fazer, não tinha que forçar nada para viajar a esses desempenhos dos pensamentos.
O bilhete para essas viagens, o cartão de crédito para pagá-las, o chek-in no balcão dos últimos dias, sempre surgia quando era levado a pensar nelas sem deixar de dizer que os muitos psicotrópicos que engoliam contribuíam para melhorá-las.
As mulheres para o coroa sempre foi algo muito superior às outras coisas, a bens matérias. Elas sempre exerceram fascínio nas suas atitudes de bom amante, bem dizendo, aquelas mulheres que do corpo, as deusas mitológicas saem perdendo, aquelas que do rosto, Monaliza, de Leonardo da Vince, passa ao largo, aquelas que dos movimentos, nem Sônia Braga ganharia no filme a dama do lotação, nem Vera Ficher nas chanchadas do Walter Hugo Kouri.
Deitado com o costado no colchão, esticado esperando a visita de quem nunca falhou, encontrava lá no fundo d’alma quase morta, o benefício que exerce quem ainda respira ares de sobre vida em possuí-lo, os pensamentos.
Numa dessas ocasiões, recebendo visita de parentes, foram ater-se com ele e pegar-lhe na mão duas meninas bem jovens, mas que sabe de tudo sobre os tempos modernos, meninas que, como as amantes do incapacitado moribundo, sabiam tirar dos rapazes de mesma idade nos banheiros das festas regadas a droga e hock end roll, nas festas rave servidas a comprimidos êxtase, complemento a satisfação de ser alegre e viver de acordo com o bom momento de ser jovem.
Saindo às outras visitas, acharam por bem fazer um estudo mais profundo com o quase morto e começaram por alisar-lhe as mãos.
Não satisfeitas em pegar só nas mãos do moribundo, resolveram que era hora de também morder-lhes os pés, as coxas, e lamber o peito que batia descompassado coração.
As duas sabiam fazer crer a quem por elas passavam no serviço da satisfação ao prazer da carne, que levantavam até defunto.
A muito, o moribundo sem abrir por completo os olhos, bater as pestanas e movimentar o corpo com maior alusão aos movimentos, nessa hora fez e pode ver as duas. Acendeu muito os olhos vindo às pupilas quase cair fora da caixa. Pelo que mexiam dele e pelo que pode distinguir, veio descobrir que podia mexer com maior intensidade as pernas, esticar-se, rejuvenescer-se.
Esticou o esqueleto, retesou até onde pode nessa hora.As juntas estalaram, as duas riram e se divertiram, por achar que estavam recuperando o quase morto.
Continuando buliçosas, descobriram que estavam fazendo um bem dos diabos, mandando embora daquela casa, daquele leito, a dona da foice que corta quem está em pé, deitado ou sentado e manda para debaixo da terra ou para o forno.
Enquanto as visitas não apareciam no quarto, posto que conversavam na sala em discussão para quem ia o quê depois que o velho juntasse os pés, as duas faziam o doente reviver outrora, dando ao momento, pleno júbilo ao renascimento.
Mordendo joelhos, passando línguas pelos peitos, visitaram quase todo o corpo do velho enfartado, quando uma se interessou em pegar uma das mãos que se sentia revivida e ajudou a ser levada as suas partes pubianas. A outra com os pés dava a mesma sina, o esfregando nos seios de si.
Meninas danadas. Eram estudantes de medicina, prostitutas ou simplesmente estavam tentando ajudar a quem precisava? Tinham o coração para fazerem parte de alguma entidade assistencialista, ou deveras queriam ver o coroa morrer feliz?
Talvez não fosse nem uma coisa nem outra, talvez fossem simplesmente duas taradas, que não encontrado hoje gente diferente para fazer o que estavam fazendo, foram encontrar no velho doente, amparo para suas taras e novas descobertas, uma vez que só tinham agido dessa forma com pessoas de mesma idade.
Usando-as de tudo que puderam em relação a fazer com o doente aquilo que deviam ter muita experiência em fazer com os rapazes nos banheiros da escola, no carro ou num motel, levaram-no a reviver um passado cheio de gloria sobre as mulheres.
Só não acreditaram que o doente fosse se levantar da cama num só salto, agindo assim, lhe caíram às cobertas. Viram que ficou de pé repentinamente e se descobriu uma criança vindo ao mundo.
Assustaram-se com o membro do doente enrijecido, trazendo o corpo numa tremura de entenderem que estava baixando um santo, dizendo aos quatro ventos que ia morrer satisfeito por elas terem surgido naquela hora no quarto e o levado a perseguir horizontes de um passado cheio de glória.
Venham meninas, estou pronto para morrer nos braços de vocês, façam esse favor a quem desse dia não passa. Dizendo isso com voz trêmula, caiu com parte do corpo na cama, parte no piso, duro como estava, acabou de ficar para sempre.
Correram para a sala as duas, onde as visitas se achavam e informaram que o homem tinha se levantado sem nada mais nada menos e caído novamente, dessa vez sem se mexer.
Chegando todos ao quanto encontraram o doente no chão, com o corpo descoberto e o membro para cima ainda em estado de alerta, tão duro quanto os outros membros.
Nada como boa química para dar vida a quem está morrendo, quando em excesso retirar de vez.

José Marques Sarmento

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

CRÔNICA RAIVOSA

Como posso escrever qualquer bobagem que deixe de sê-la, se tudo em mim por esses dias se revolta por dentro,
Mim enche de pensamentos revoltos e me desarma das algemas contemporâneas,
Mim devolvendo ao passado,
Quando aos poucos me encontro querendo me jogar no lixo aonde dormem os porcos?
Dane-se a leitura dessa gente que se acha frescamente abanado,
Pelos sabedores do vento da rasteira,
Produzidos pelo latifúndio da intelectualidade medíocre!
Dane-se a literatura,
Essa que não é,
Mas que por algum motivo escuso,
Alguém que se acha no direito de fazer de trouxa os tolos em dizer que é porque é!
Dane-se quem se preocupa com essa linha da arte,
Que por hoje não engata simples primeira marcha em direção à criação literária de vanguarda!
Vou pôr no entulho e preparar para a fogueira,
Tudo que leve escrito o que saiu desse sentimento mesquinho que carrego por dentro.
Página sobre página não ficará incólume da chamas.
Como fui me preocupar com essa praga que se chama leitura,
Que mais adiante fez nascer em mim à ânsia de criar literatura?
Poderia esse que vos esclarece e escravo do saber,
Não ter se preocupado com nada relevante a leitura de qualquer gênero literário.
Estaria livre dos pensamentos hediondos criados ao longo do tempo,
Pela maneira de viver segurando um livro aberto sob o lusco fusco d’uma lâmpada amarelada,
Para tentar desfuscar a alma.
Como fui gostar dessa bobagem de querer saber desde menino sobre as historias escritas?
Como fui me interessar até pelas historias das fotonovelas,
Mais adiante os romances dos pokts books, dos contos, romances?
Com a idade avançando, os entendimentos vindos, os clássicos autores surgindo,
Como Dostoievskis, Camus, Gabriel G.Marques, Machado, Graciliano
E tantos mais que aqui não caberiam citá-los?
Entendam a minha revolta.
Da literatura não tirei vintém que desse pra alimentar as moscas.
Pois entre ela e eu têm outras responsabilidades à prova.
Uma carreira de filhos esperando regar a boca e mastigar.
DANE-SE A LITERATURA COM LETRAS MAIÚSCULAS E GARRAFAIS.
Minúscula se tornou essa área da arte para mim de hoje em diante.
Não posso mais ver uma página sequer em branco, escrita quero rasgá-la.
Estas não mais me auxiliam me excitando na criação para ver passar o tempo,
E na ociosidade fazer algo prestável,
Mim exorcizando de alegria basbaque,
Pela alegria da criação da escrita ter dado a luz.
Vou de agora em diante matar o tempo com bobagem.
Vou pro boteco da esquina.
Pra sinuca.
Pro futebol.
Pras putas! Elas que limpem as partes que os homens mais gostam,
E me ceda a preço de custo a sua buceta.
Chega de ficar preso ao computador lendo os disparates daqueles que não tem o que fazer,
Vendo os lados baixos da minha pessoa se aparelhar de gordura,
Recebendo o corpo o formato da pêra.
Chega dos contos e romances e textos,
Como esse que não encanta o mais pobre mortal de leitura,
Ou o mais entendido leitor.
Tou cheio!Vazando feito caixa d’água engripada a bóia.
Tenho mais o que fazer.
As crianças pedem socorro.
Dizem que estão crescendo e querem usar nike,
Passaram do tempo que engoliam qualquer marca.
Chega!
Tou cheio de me preocupar com a passada vida literária de grandes nomes da escrita do passado,
De saber dos que escrevem a esse tempo que corre alheio as causas relevantes da sociedade.
Quero é sair por ai, me espairecer sem pensar em ler e escrever.
Só quero ver e sentir d’agora em diante,
O aroma desumano que transporta pela existência,
Essa gente que se diz relevante pras coisas da arte.
Pois até agora só me levou a me chamarem de poeta sonhador.
De querer ser participante de uma casta de gente que pertence a outro mundo,
Por ter vindo de famílias tradicionais e ter contato com eminências.
Danem-se os contos, os romances!
Danem-se as preocupações em saber quem escreveu o quê.
Tou perdendo meu tempo.
Tou cheio de ver parte dos meus livros dentro de caixas ocupando espaço,
Que seria de algo que trouxesse maior alegria pra vista.
Minha alma não suporta mais ver o que foi feito não acontecer.
Preciso lembrar que não nasci para ser o que tentei ser.
Se isto é dizer que sou um autor fracassado.
Então está dito.
Sou um autor fracassado mesmo tendo conseguido editar.
Melhor seria se tivesse ficado engavetado recebendo ao correr do tempo o pó das traças.
Não me teria tornado um idiota.
Onde muitos o chamam de escritor.
Outros não entendem ser eu um.
Por não vender livros e viver dos 10% deles.
Nem referendar o que escreve publicando em algum meio de comunicação.
Tou cheio da luta para editar um livro.
Tou cheio de ficar pendurado nos ouvidos dos amigos que podem doar valor para tal.
Danem-se a leitura, a escrita!
Vou suportar ver de hoje em diante somente páginas brancas e olhe lá.
Sem o aparato das letras me consumindo às vistas.
Terei que suportar a carga da inadimplência de escrever para supostamente lavar a alma,
Como dizem muitos que escrevem
Achando eu ser mentira, pois acho que querem mesmo é aparecer.
Chega!

José Marques Sarmento

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

ACERTO DE CONTA

Mano, olha aqui, não tou brincando, tou falando sério, se a grana não aparecer até amanhã, meto bala nessa fuça!

Pelo que contam os vizinhos e conhecidos do morto, esse foi o último aviso que escutaram das janelas semi-abertas de suas casas, num teatro a céu aberto. Às pardas luzes espaçadas dos postes da rua não iluminavam com focos fechados os atores da dramática cena de gestos largos e vozes exuberantes. Noite em que os minutos quase a encostavam as zero hora de um dia em que o caos mais uma vez se fez presente à cidade, pela chuva ter derrubado barrancos, alagado as planícies que num passado não era prejudicada pelas inundações.Não possuíam o que ocupa hoje espaços tão reduzidos, barracos formando grandes favelas que passa visão de horror a quem mora bem e distante das péssimas moradias da periferia.

Acossado pelos moleques com quem divide os pequenos roubos, tendo a companhia do muro da sua casa protegendo a retaguarda, o nada protegendo os flancos e a vanguarda, com dois revólveres o ameaçando, Damiãozinho é intimidado pelos dois comparsas com quem divide produtos de assaltos.

Precisavam embolsar o dinheiro do carro que conseguiram pegar na mão grande quando o dono saia com pacotes de pão numa mão, a outra ocupada tentando acender cigarro recém sacado do maço e retirar a chave do bolso. Na distração de estar tentando fazer mais coisas que duas mãos têm liberdade de praticar ao mesmo tempo, abrir o carro, acender o cigarro e segurar o pacote de pão, foi abordado pelos três, quando sentiu uma das armas com raiva pressa descer e beijar o frontal da cabeça sem ser por amor ao próximo, o ódio nessa hora falou mais alto que o tão referenciado sentimento amor.

Eram dessa forma que os três amigos crescidos em vilas diferentes, se conhecido a pouco devido às correrias da vida louca do mundo do crime, faziam para conseguir se vestir, comprar droga, possuir as cabritas que rodavam o dia todo e parte das noites nas correrias, fazer presença nas festas pela vizinhança e calçar as melhores marcas de tênis, mesmo que essas fossem falsificadas e contrabandeadas dos paises do oriente...ou copiados pelos homens de negócios sem fino trato para com pagamento de royalty.

Talvez tenha sido morto, dias depois, pelo fato de não terem crescidos juntos na mesma vila, se isso tivesse acontecido, o respeito viria em dobro ou dariam mais um tempo para as cobranças ou no próximo assalto o devedor deixaria quite a dívida por não levar a parte que lhe caberia.

A amizade foi formada já no mundo do crime, então resolveram se dissociar dos outros comparsas que estavam pisando e montar a própria firma. Não sabia o que veio receber balaços no futuro, que os amigos de mesmo conluio e sócio poderiam matá-lo. Não acreditou, porque achava que dividindo o mesmo trabalho, um cobria a pisada escorregadia do outro em ensaboado piso e assim levaria os assaltos na boa.

Foi por muito avisado de que poderia acontecer, pelas cobranças da parte em dinheiro de cada um não aparecer até então.

Dia sim, dia não, apareciam os dois cobrando de Damiãozinho o que devia, às vistas da porta de casa onde residia com os pais, à mulher e um filho recém-nascido.

Uma vez ou outra quando o pai estava em casa, se metia na discussão para retirar o filho do meio da encrenca e dar conselhos aos comparsas que não fizessem mais o que estavam aprontando frente a vizinhança.Quando não era ele, a mãe tomava as rédeas, esta sempre achando nas palavras que o filho dizia, ser merecedor da sua confiança.

O pai não, quando conseguia produzir que o filho descesse da rua para casa e o seduzia arranjando que se sentasse no sofá da sala, desembuchava da boca o que estava engasgado na língua, em conselhos e outros modos de agir, muitas vezes retirando das páginas escritas da bíblia o que tornava verbo.

Como ninguém conhece ninguém nem de perto nem de longe, os pais de Damiãozinho também não o conheciam, para eles, o filho não vivia enrolado nas correrias marginais dos vizinhos da vila, não fazia aquilo que era conversado e explorado diariamente pela boca dos moradores da rua. Só os filhos dos outros tinham o poder de cair no crime, os filhos de cada um dos moradores daquelas quebradas eram santos anjos que a todos os céus envaidece e fica o nosso senhor os olhando, protegendo os passos de cada um em direção aos erros e acertos.

Dois dias depois, na certa não tendo acertado o que devia com os que um dia foi amigo, Damiãozinho recebeu a última visita.

Contam uns vizinhos que ele merecia ir, mas não quem foi junto com ele, por se meter em direção à bala para protegê-lo.

Em mais uma noite de terror na periferia os tiros despertaram uma vez mais a vizinhança, e quando os tiros são enviados, na mesma hora as janelas se abrem para os mais chegados em ver a desordem humana acontecer em direção às vistas, mesmo tendo que negar dias depois que tenha assistido alguma cena do crime, não querem se comprometer, o filme assistido é de posse individual e não coletiva.

O pai em proteção ao filho se posicionou de forma a que não atirassem.

Contam quem sabe mais amiúdo do caso, que os comparsas que vieram para resolver a questão de uma forma ou de outra, se assustaram pensando que o coroa tivesse armado e, outra, por algumas vezes dizer que deixassem de agir como agiam.

Morreu o coroa, por levar a mão para trás e trazê-la engatilhada entre os dedos, pequeno livro sagrado que carregava no bolso da calça.

Onde já se viu, o homem todo dia ao chegar em casa tomava banho e se arrumava para ir falar da palavra de deus em casinha formada templo alugada pela própria família para juntar os irmãos de mesma fé.

Deixando dois corpos estirados, o pai na mesma hora dizendo adeus aos que continuaram vivos e o filho conseguindo se levantar e sair pedindo socorro pela rua, os moleques vazaram varando a noite pulando muro sem vistas igual os que viram e não viram.

Como ninguém viu nada, na certa estão agindo da mesma forma, isto é, se não pegaram alguém como eles para fazer consigo o que fizeram com Damiãozinho, porque é certo, como explicam os rifões populares mais conhecidos copilando as leis de Moisés ao seu povo a milhares de anos, quem com ferro fere com ferro será ferido ou, olho por olho, dente por dente, ou,..meter fogo depois do querosene.

terça-feira, 17 de julho de 2007

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segunda-feira, 16 de julho de 2007


José Marques Sarmento, nasceu na Paraíba, mora em São Paulo desde 1977 e trabalha como gaffer cinematográfico. Casado, quatro filhos. Apesar de ter concluído sua alfabetização aos 14 anos, o romance O sequestro do negativo exposto é seu sexto livro. É autor de: Um homem Quase Perfeito, A Revolução dos Corvos, Urbanóides:um caos paulistano, Paraisópolis: caminhos de vida e morte e O Sequestro do Negativo Exposto.
Conseguiu editar seus livros graças a lei de incentivo a cultura do municipio de São Paulo, lei 10.923.
Tem mais 4 livros "romances" prontos no word de nomes provisório:Por Justa Causa, (250pg) - Abaixo o Amor,(150pg) - Ângela:um jardim no vermelho,(180pg) -
Jose Marques Sarmento, o operário da luz, iluminado pela literatura.

O corpo era um molejo

Homenzinho franzino, estatura baixa, demonstrava claramente ter passado muitas dificuldades quando criança.
Mané Fufuba, este era seu apelido herdado desde a infância, ganhando mais a frente, novo apelido,"Catabi" por andar trupicando.

O gingado no corpo o fazia quase um boneco Mamolengo.
Bonezinho cobrindo as entradas, óculos escuro para fugir da claridade medonha de sertão. Figura extravabunda.

Sua performance junto aos amigos de bebedeira era de pura chacota.
O que mais o divertia era viver intensamente, fora o trabalho que o castigava muito, mas isso não lhe tirava o animo para a diversão junta a náica de gente sem que muito o que fazer. Até hoje os que ainda vivem sentem falta da figura engraçada dele, principalmente quando a "marvada" tomava conta dos miolos.
Editora Scortecci.
O Seqüestro do Negativo Exposto
José Marques Sarmento

Sexto drama policial do autor, este enredo parte da história de produtoras de cinema que, em meio ao grande furor econômico no mercado publicitário, se vêem envolvidas em um crime incomum. O romancista revela um lado diferente de profissionais que detêm o poder da imagem, contado através de seus inusitados movimentos semânticos e aventuras lingüísticas que sempre surpreendem o leitor.

208 páginas - 14x21cm - ISBN 978-85-88840-63-8
Editora Zouk.
Urbanóides: um caos paulistano
José Marques Sarmento
Romance que traça um perfil fiel da violência de São Paulo, visto e sentido por um homem comum, Chico das Dores, motorista de ônibus que circula diariamente pelas ruas e avenidas da cidade.
200 páginas - 14x21cm - ISBN 85-7372-444-7 - (Ed. Scortecci)
Paraisópolis: caminhos de vida e morte
José Marques Sarmento
Mulher grávida e amante são flagrados e mortos pelo marido. Uma cena corriqueira, mas de desdobramentos imprevisíveis, que vão tornar a vida de Jorjão da Silva uma aventura de vida e morte. Ambientado em Paraisópolis, este romance é muito mais que uma ficção, é um amplo e bem documentado panorama de uma das maiores comunidades de São Paulo. Como escreve José Roberto Torero, 'um choque de verdade, uma nova voltagem, uma nova luz'.
248 páginas - 14x21cm - ISBN 85-88840-11-1
Editora Zouk.

Apresentacão de José Roberto Torero (foto) para o livro "Paraisópolis, caminhos de vida e morte" De José Marques Sarmento

Primeiro foi um metalúrgico-presidente. Agora um eletricista-escritor.

Parece que metalurgicos e eletricistas e balconistas e caminhoneiros e babás cansaram de ser personagens secundários.

E eles não se contentam em ser personagens principais.
Nada disso.Eles querem mais, querem ser autores.

Talvez tenham se cansado de ver suas histórias mal escritas e resolveram escrevê-las por si mesmos.

É o caso de José Marques Sarmnento.

Assim como Paulo Linss e Ferréz, ele conhece temas, problemas e dramas brasileiros, não por ouvir falar, mas por vê-los pela janela. Ou pelo espelho.

Escritores-eletricistas como Zitto, podem trazer um novo ponto de vista para a literatura nacional. Estes escritores-eletricistas podem nos dar um novo choque de verdade, uma nova voltagem, uma nova luz.

José Roberto Torero.



Crítica:

A vida do escritor dá força as suas palavras

Tomara que isso seja literatua, diz José Marques Sarmento, apontando-me o exemplar de seu mais recente lançamento, o romance "Urbanóides, um Caos Paulistano".
Será que isso é literatua?É a pergunta que muitos escritores fazem, depois de enfiarem um ponto final num romance.
Quando um cítico mal-intencionado quer desdenhar a obra de um escritor, diz:"Isso não é literatua".Já fizeram comigo.Já aconteceu com muitos.
Outros críticos esperam que cada obra acrescentem elementos inovadores ao gênero.Um crítico certa vez, ao analizar um livro meu, escreveu algo como,"é bom, mas não tem novidades", como se fosse minha intenção querer inovar algo.
Qualquer sequencia de palavas ordenadas de tal forma que deem sentido a uma história é literatua, "a arte de compor e escreve", "na definição do dicionário Aurélio".
É evidente que o mais novo romance de Sarmento é liteatua.E é bom?
Bem, aí são outos cascabulhos.Bom para quem ou para que, Mané?
Paulo Coelho é bom para muitas pessoas.Guimaães Rosa é bom para os ouvidos, os olhos e o coração, mas tem gente que o detesta.
Não se pode ler coelho esperando um gande jogo semântico.Não se pode ler Guimarães esperando uma degustação distraída.Coelho se ler numa fila de espera.Guimarães se ler em casa, em silêncio, concentrado.
Quem quiser ler em Sarmento profundeza semântica talvez não fique plenamente satisfeito.Agora fique a vontade quem quiser ler nele as particularidades de uma literatura popular, rica, dinâmica, desesperada e verdadeira.
Contrariando os caminhos traçados por alguns escritores que escrevem sobre o que não conhecem e se atrapalham com pesquisas (já aconteceu comigo),Sarmento vive aquilo que está em seus livros.
A indignação de um motorista de ônibus que, mais que ninguém,é testemunha do caos humano,é complemento da indignação do autor, o que dá força as palavas.
O narrador tromba com tipos urbanos, sente saudades da sua terra natal e lamenta que muitos passageiros"...cheguem cheios de sonhos e acabem tropeçando nos próprios pesadelos.É literatura ou não é?

Macelo Rubens Paiva para ilustrada da folha, em 2 de dezembro de 2000



CARTA DE LEITOR DO LIVRO “UM HOMEM QUASE PERFEITO”

São Paulo capital, novembro de 2000

Caro escritor,

É com muito carinho e admiração que escrevo esta simples carta. O motivo que me leva a escrever-te é o seu prezado livro “Um Homem Quase Perfeito”, leitura a qual fiz com muito gosto e prazer.

Sou um amante de leitura e recentemente resolvi ler livros de autores que desconhecia, era um belo feriado prolongado de finados, quando indeciso procurava um livro interessante na biblioteca pública do Tucuruvi, bairro onde resido.

Muito feliz encontrei o seu livro, com o título que me chamou a atenção, resolvi que aquele preencheria minha tarde de sexta feira. Tenho que parabenizá-lo pela ótima capa e fotografia.

Sou muito crítico com as minhas leituras e quando o autor não consegue transmitir sentimentos, logo para de ler e troco por outro livro. Felizmente esse não foi o ocorrido com seu livro. Comecei a ler e não parei mais, quando percebi já tinha “devorado” o livro todo, passei a tarde lendo, e não é qualquer livro que consegue prender a minha atenção do começo ao fim.

Quando cheguei ao final do livro e vi seu endereço resolvi, pela primeira vez escrever para um escritor. Tenho que parabenizá-lo pelo seu estilo, pelo conteúdo e pelos sentimentos e lições que o livro nos apresenta.

Gostei muito de sua obra, sou paulista e nunca fui ao sertão, cresci e passei meus dezoito anos no meio dessa “selva de pedra”, mas com seu livro eu pude ver cada cenário, cada personagem, cada árvore, a terra rachada, o calor, a fisionomia das pessoas. É como se eu tivesse acompanhado a vida do Fufuba pessoalmente. Pude repensar sobre os temperamentos humanos.

Fico muito feliz em ver que o Brasil, ainda, possui ótimos escritores como você. Não sei expressar em palavras os sentimentos que você com muita facilidade expressou em seus personagens que no cenário brasileiro são muito reais. Você escreve como alguém que presenciou de perto, pois em cada capitulo você transportou o leitor para dentro dos bares, das casas e para cada gole da “marvada”. Mas uma vez meus parabéns.

Gostaria de saber quais são os autores que você gosta de ler, e quais aqueles que te influenciam. Por não conhecê-lo senti falta de uma breve biografia no final do livro e acho que seria legal uma apresentação no inicio. É um pouco estranho ler algo de alguém que você gostou, mas não saber de quem se trata. Não entendi porque a publicação do livro só foi possível graças a lei número “não sei quanto” do ministério da cultura? Você encontrou muita dificuldade para publicar sua obra?

Procurei através do fichário da biblioteca outras obras com seu nome, mas não encontrei, gostaria de saber se você chegou ou pretende escrever outros livros?

Com muito prazer gostaria de ler outras obras e textos de sua autoria.

Quais foram seus objetivos ao escrever “Um homem Quase Perfeito”? Sei que não deve ser fácil a publicação de um livro, mas espero que esta carta seja um incentivo para que você continue escrevendo. Claro, como um leitor admirador gostaria de pedir seu autografo, uma carta assinada por você seria guardada como uma grande lembrança.

Sou estudante e um dos meus sonhos é escrever um livro, infelizmente, hoje em dia as pessoas não lêem muito, as que lêem gostam de ler coisas místicas, ficção, coisa que eu não perco nem um segundo lendo, pois gosto de leituras inteligentes, assim como seu livro que agora recomendo aos meus amigos.

Espero que esta carta tenha sido do seu agrado. Desejo a você e seus familiares saúde, alegria, sucesso e reconhecimento. Que você seja reconhecido e consagrado por muitos críticos e amantes da leitura.

Atenciosamente,

Marco Antonio Garcia

06/11/2000

“Se seus sonhos estiverem nos céus, lá no alto, saiba que eles estão no lugar certo, agora construa os alicerces”

Num poeta não se bate nem com 1 flor

Como pode caros Srs.alguém ter a coragem de bater num velho poeta, alem de tudo Doutor.

Por minha cabeça não passa existir um ser vivente, capaz de tanta imponência.

Será que este sedutor da violência se exprime dono da verdade e usa a força do braço para disparar seu rancor? Ou será que não conhece a intimidade de um poeta, que cria estrofes nos versos para esquecer certas dores?

Pelo jeito parece ser este um canastrão, gente que não sabe tirar de letra, profundas discussões filosóficas.

Daqui do meu lugar, quase cai da cadeira, e olha tão longe me encontro da Cidade Sorriso, terra que me viu partir chorando intimamente à quase trinta anos.

Descobri trabalhando nas vazantes irrigadas do perímetro de São Gonçalo, tomando banho no açude de mesmo nome, que São Paulo era meu lugar.

PARA UM FUTURO NÚMERO 10

(Olhar intrigado e crítico de um pai vendo o filho participando de uma peneira)

Do meu canto fora das quatro linhas de jogo, com dedos de garra segurando o alambrado, fico torcendo que a bola tome chá de asa de beija-flor, que engula pelo lugar que lhe enfiam o bico para não ser a bola murcha da vez, suco de óleo lubrificante de avião supersônico, para quando receber os pés que a acaricia com mira certeira, vá de encontro ao que quis o seu admirador com a velocidade de jato.

Fico torcendo, torcendo, mas infelizmente vejo que não acontece o que peço intimamente. Os chutes em quase todos os lances saem mascados, mesmo tendo o dono das pernas, o tamanho das do tuiuiú e, tendo feito força suficiente para por abaixo uma parede de tijolos nus.

Rapa-Bosta, falam uns. Perna de pau, dizem outros tantos adjetivos compostos mais. Oralmente falo do meu lugar de solidão sem que ninguém perceba o movimento da minha boca, pois estou ligado torcendo por alguém que sou eu, torcendo por quando a bola chegar nele, faça jogada de um Pelé.

Depois de duas ou três intervenções, percebo que é alguém que não nasceu para dar afago de bom amante à pelota e, em cada jogada que os bons de bola fazem, vão o afastando mais da redonda, o deixando de lado, esfriando o seu furor em querer mostrar que também é bom boleiro, pois é publico e notório fazer jus a frase antiga: a bola procura sempre os craques.

De múltiplos pés juntados aos dois de mim mesmo, vejo-a partir a bola girando inibida e sem direção, seguindo em trajetória de extensa curva para qualquer canto do campo, menos para o objetivo principal: o gol ou os pés de quem a solicitou e que joga bem.

Bola sem direção essa que vejo, saindo-a de 90% dos pés que correm feito animal em fúria em busca de alimento, mas que não nasceram para encontrá-lo no melhor pasto das quatro linhas do campo de futebol.

Do meu canto de solidão e sonho, sinto certa inveja no rosto de quem tem filho que chuta bola certeira, por ver que de alguns pés em menor grau de desenvoltura, à pelota age com a naturalidade dos monges budistas endereçada ao passe ou ao gol e, com a sutileza de um apaixonado, cai nos pés de quem a admira e sabe direcioná-la nos passes e dribles ligeiros para fugir dos pés de carrascos concorrentes.

Como sou egoísta de não ter olhos para as bolas que saem de outros pés, moldados sobre a dinâmica do gênio da natureza que detém o poder de fazer um craque de bola nascer.

Tão poucos sabem fazer da bola seu brinquedo de raro algum volante ou zagueiro roubá-la na facilidade. Bonito é vê-la a quem sabe tocá-la com a sutileza dos Robinhos de hoje, se é que tem mais de um como ele e, ela sair girando no próprio eixo, deslizando no tapete da perfeição, dando dificuldade ao goleiro em espalmá-la ou encaixá-la retirando-a da trajetória da rede.

Bolas que partem de pés de gênio assim, fazem que o goleiro maldiga o atacante, que com certeza é moleque que soube namorá-la desde a infância, a visualizá-la entrando entre a trave e o goleiro, ali, naquele lugar onde a coruja faz o ninho, na junção dos dois ferros que formam ângulo de noventa graus, e assiste depois do chute, ela ir lentamente ou velozmente no lugar escolhido pela visão do craque que tem visão panorâmica de toda área do campo.

Bonito mesmo é ver moleque bom de bola, que quase sempre nos seus chutes ao gol, faz o goleiro beijar o tapete verde do gramado e se contorcer em dores de remorsos, tentando lentamente se levantar, ouvindo gritos de alegria da torcida adversária, chegando aos ouvidos, ensurdecedores uivos de vais da torcida caseira.

Como sou egoísta em não ver o filho do pai que está ao lado se contorcendo de alegria nos gestos de braços e pernas, vendo o filho que sabe tudo de bola, tocá-la com suavidade, sem esforço, sem a maltratar, nem a ele o físico.

Como sou egoísta em ver só o meu filho tentando ampará-la entre as pernas, no peito, na coxa, chutá-la de cabeça e a dona de todas as glorias do futebol se insubordinar e não querê-lo para si.

Esse a quem invejo “numa boa”, porque o futebol é a arte de quem não sabe enganar, tem destino garantido num grande clube espalhado pelo mundo, terá o numero 10 nas costas, levando a responsabilidade de dá continuidade a arte do futebol clássico, onde não só a força física é parâmetro para as conquistas.

Falo com alguém do lado que na certa é pai de algum moleque da peneira. Esse tá garantido. Vai ser o craque de qualquer time grande. Do Brasil, do exterior, do futebol arte.

Do meu canto me vejo o assistindo e torcendo por ele, não mais pelo meu, esse não tem jeito, porque sei que o futebol, o craque de bola, o diferenciado, merece aplauso, por não ser mais um entre os onze para completar a escalação.

José Marques Sarmento