121-Da Vinci-
Tá bom minha querida Mona Lisa, que um dia deixará de
ser lisa e dura, e se condenará ao supérfluo. Perdoe essa minha falta de
sentimento para com quem quer ser recriada e penetrada ao mesmo instante da
criação. O erro não é meu, é do próprio sentimento comum a todos os artistas, desejar
e não desejar a sua cria intimamente, por ser a musa, vivente só para
ser apreciada pelos desejos secretos e não viver em pessoa a ser tocada.
122-Mona Lisa-
Então adeus o medo do meu criador, já não existe
aquela total enganação e encenação a despeito de quereres me desejar ou não em
viva pessoa como tinhas nas preliminares da nossa relação.
123-Da Vinci
Levante-se e ande pelos montes cristalinos do meu
peito, pelo menos a última vez, beije minha testa usurpando-a, alise minhas
costas com as garras da ambição, só não cuspa na minha cara, assim seria
desmoralizar demais nossa discussão.
124-Mona Lisa
Levante-se, então, erga os braços para cima da cabeça até chegar aos céus,
faça a pincelada derradeira para renovar a minha expressão corporal, pois a
facial está concluída. Depois carregue novamente as energias e venha mesmo em
bons ou maus dias pra junto do meu peito quando se cansar da vida que vais
levar como artista de pobreza a dar com pau.
125-Da Vinci-
Eu não gosto muito mais do seu sistema de avaliação, ele
já não será suficiente para sustentar a base de corrupção que entrará a vigorar naquele país que, dizem ser do futuro,
mas que nunca chegará a ser pelo seu provincianismo e povinho. Feito de
cafajeste de bem e políticos de mal com a sonhada oligarquia vigente no
traseiro do quintal alheio embolsando a parte maior do boi comestível e emprestando a parte maior a juros inexistentes
aos bancos, deixando ainda mais outras classes menos favorecidas desfalcadas de
bens principais.
126-Mona Lisa
É assim que me queres ver sorrir a qualquer hora
passando sempre por essa demora de dizer às coisas que sinto? Um sorriso falso
em certos lábios não é tão fácil de livrar, para encantar ou desencantar de vez
a transformação daqueles que quer ver e sentir o hálito infestar o ar da
imperfeição facial. Não é à toa que me banho de lágrimas e vivo nesse lado
podre da cidade, no lago apodrecido de germes tentando ser pescado pelos anzóis
do desgosto, enquanto os capitalistas giram pela larga cidade mostrando suas
fardas douradas, levando o tesouro encostado atrás de imensa corrupção. Vivo
numa casa tosca chamuscada de cupim, penalizado igual o sofrimento de reféns em
cativeiro, depois sorriem para o vizinho comentando o desenvolvimento do país
que a ele ainda não chegou.
127-Mona Lisa-
Ora, Leonardo, não me faça rir à toa dos à-toa na
bosta do giro. Esse prefácio de iniciação é pura sentinela dormindo com a arma
encostada no saco, bateu o pé o ladrão, no pesadelo do sono, atira contra si
mesmo.
128-Da Vinci
A falsa etiqueta não faz o meu gênero.
129-Mona Lisa-
Não acredito. Isso é subterfúgio.
130-Da Vinci
Você os saqueia.
131-Mona Lisa
Não, mas fugirei dos sindicatos e jornais massacrados
pelas explosões sacanas em combinação com o poder que vem de cima, jogado por
falsos armados fardados anarquistas, escravos do vício do poder da farda.
132-Da Vinci
Eles serão os prendedores da respiração alheia, irão
fechar as portas da expressão artística, os Generais desse tal país que se
chamará Brasil. Viverão os artistas
penalizados por aqueles que procurarão nos caminhos tortuosos a verdadeira
democracia, por julgarem todas as cores como as cores de qualquer iniciativa
governista, fazendo deus e o diabo de um mesmo pensamento e produto químico.
133-Mona Lisa
Não admito que seja mais um articulador sem braços, para
me pintar e me retratar como sendo a sua Amante de todos os dias de nosso tempo
e que serei para sempre a sua musa quente. Você precisa do meu sorriso perfeito
para me deixar no jeito de engrandecer e agradecer a quem vai me visitar.
134-Da Vinci
Então, Mona, pra isso acontecer, Madame, terá que
engrossar meu caldo e me dar pernas para assegurar o meu sustento, logo depois então
me tire do meio daqueles reacionários da sociedade fatídica.
135-Mona Lisa
Essa sociedade não vai lhe aceitar assim como é, não, Criador,
pois você viverá por abaixo do máximo desprezo dos sabedores das coisas. Serás
sozinho no meio da querela daquela gente, gente que irá jogar seu sonho nos
jogos das loterias, dando evasão à ilusão nos jogos de futebol ou nos braços
estendidos das avenidas por onde desfilarão as escolas de samba do primeiro
grupo.
136-Da Vinci-
Porra, meu, então agüente firme seguro e tranqüilo a
decepção dos instantes que o encontro lhe deu. Seja seu próprio grande canalha
para levar-lhe as alturas nas alvuras do tempo. Não decepcione o Rei. Ele está
presente e quer-te ver sorrir a qualquer tempo de festança ou faltança. Ceda
aos seus caprichos, então deixarás de ser marcado a ferro em brasa pelo ferrão de
ferrar as ilusões.
137-Mona Lisa
Isso mesmo, terá que ser você e mais ninguém. Sentirás
a dor na tua carne, sentirás as dores no corpo onde corre sangue sem nenhum
prestigio. Sentirás a dor de apanhar nesse corpo ensangüentado, bem longe das vistas das autoridades que fazem a
fome, a resistência de corpos esquálidos, de ossos a mostra, descalvados de
carne gordurosa para esconder a ossada esquelética. A gente, maioria daquele
país, te verá desse jeito.
138-Da Vinci
Quero que me entendam por querer levar a liberdade da
ação, juntando a tese lúcida da memória, tendo o frio do tempo como o parente
mais próximo, vindo cair por fraqueza do espírito e organismo, nas sarjetas
estragadas do entendimento irracional do estado governamental.
139-Mona Lisa
Serão pessoas livres de tempo a gente daquele país, por
não terem hora marcada para nada que os faça cidadão. Nunca serão soltos da
prisão que os aprisionam desde o nascer e não encontrarão o valor individual e
coletivo nos esquifes do tempo.
140-Da Vinci
Será que serão todos cruéis os donos do poder soberano
daquele povo de país continente, que receberá o nome de Brasil, país do futuro,
mas que nunca chegará para a maioria de sua
gente faminta o necessário para a resistência e sobrevivência?
141-Mona Lisa
Nunca serão pássaros livres em voas altos pelas costas
da beleza que emana da terra Tupi-Guarani, nem encontrarão os caminhos abertos para quem quiser por si só
partir em busca da alvura dos dias.
142-Da Vinci
Eu queria força maior nos meus braços e pernas para
abraçar a terra e pisá-la com a reta certa de encontrar o que dizer e o que
fazer para aquela gente sem nada para mastigar pelos dentes. Queria ter o
coração para dar as belas mulheres e sentir a sensação alucinante do prazer que
é ser e viver no que sobra de mais para os outros.
143-Mona Lisa
Eu queria sentir essa reflexão em outras mentes
distantes daquelas pessoas, queria evoluir para a grandeza da sabedoria e, logo
após, pôr para dentro de mim o que me faria conquistar a vitória do terceiro
tempo de minha vidinha.
144-Da Vinci
Eu queria ter a certeza que iria ganhar aquela casa na
loteria, com carro na garagem e mobília, jogando num BAU feliz qualquer, antes
de desembolsar os tutus monetários no valor de alguns mil em dinheiro vigente,
para pagar adiantados os bilhetes da federal.
145-Mona Lisa
Queria sentir na desenvoltura dos meus dedos a maciez
da pele do meu amante preferido, entre muitos outros, queria ver a chama por ti
reacender em diversas claras chamas partes de mim. Vamos mais uma vez pôr na
telha que precisamos dar um jeito nessa nossa ceia sexual e nos enforcar
pendurados numa árvore Pau-Brasil.
146-Da Vinci
Não, agora eu quero é fazer um cego andar por sobre os
espinhos do seu próprio destino e depois disso, pô-lo no trono da sabedoria,
fazendo enxergar do por que tudo tem um porquê, em seguida pedir-lhe sabedoria
florida para a vista que começou a ver, mas que não sabe ainda distinguir as
cores do certo e errado.
147-Mona Lisa
Eu quero é correr pelos campos daquela gente índia,
das Iaras escondidas e reprimidas naufragando os Sacis e as mulas-sem-cabeça nas
conquistas destemidas das matas virgens, usurpadas logo após o sufrágio na urna,
enganados logo após a subida ao poder dos homens brancos da nossa descendência.
Vou dizer-lhes que não quero mais os distintos referendados outra vez, que o
bom seria pôr no poder alguém que saísse do Gene deles.
148-Da Vinci
Eu quero é soltar todas as cordas que prendem a
respiração ofegante daquela gente, por viver eternamente dentro da gente política
que não sabe fazer e acontecer, nem desfazer o caos nacional, pela falta de
cumprir as promessas de melhores dias que fizeram antes do pleito. Dias que
ficarão marcados pela presença das raivas repugnantes aos donos de todos os poderes.
149-Mona Lisa
Eu não quero a precisão de um instrumento falso para
me guiar, dele já estou cheia e quero acelerar distância.
150-Da Vinci
Eu não quero meu capital diário cotado nas costas
suadas daquele povo sem ossos para se firmar como pessoa decente. Eu tenho
direito a um determinado valor sem bolor no maço que cabe a mim, mas desde que
venha da corrente deslizante sem a oscilação que seria se viesse de horizontes
descabidos.