quarta-feira, 25 de novembro de 2015

É OSSO!



É OSSO
Meus ossos de uma hora pra outra começaram a se rebelar com a minha presença sempre exigindo deles mais esforço  pra chegar em algum lugar de difícil alcance.
Quando das corridas malucas pra perder peso teve uma hora que empacou, meus ossos, me fizeram estancar de supetão por se amolecer por entre as minhas carnes e dizer pra que eu não saísse do lugar.
Ralhou: isso não é vida companheiro de luta, irmão das mesmas angústias. Somos sangue do mesmo sangue, filhos do mesmo DNA, temos que entrar num acordo, preciso ser cuidado com mais zelo pra durar igual vai durar toda sua estrutura mole do seu corpo.
Noutras corridas pra chegar primeiro nas oportunidades que apareciam, meus ossos também se fizeram amolecer, se revoltando.
De uns tempos pra cá anda me avisando: segura a onde meu irmão gêmeo, somos do mesmo corpo, da mesma estrutura, regados pelo mesmo sangue, o que você engole, a me chega também.
            Meus ossos querem me fazer retrair na corrida  para se colocar para tentar as coisas boas que a vida tem pra dar de alguns anos pra cá.
Toda vez que meus ossos acham que excedo para o plantio de algum feito que acho razoável pra me colocar  perante a sociedade, eles me deixam no chão sem poder levantar.
Quando estou ávido para chegar correndo feito um tantã em algum lugar, muitas vezes meus ossos dizem que esqueço de que ter uma vida saudável é melhor, pois, com o tempo, outros elementos que formam o corpo humano, que participam dos mesmos eventos, logo estarão pedindo arrego.
Quando ocorre de se revoltar, meus ossos acabam amolecendo, se tornando uma espécie de borracha que não quebra quando enverga, mas me retira às forças para que o meu corpo não chegue aonde quero, nem a mente fique alegre.
Nessas ocasiões acabo ficando puto com os meus ossos, quando me ponho a me arrastar  no lugar que me encontro clamando a eles que tornem a endurecer, foi pra isso que os milhares de séculos existiram, para formar o ser humano como é hoje, com ossos obedientes e equilibrados.
Diz-me: não, meu irmão, tou agindo com você desse modo pra segurar sua onde, sua loucura de querer estar em todo lugar se desgastando de forma a me deixar com menos tempo de vida. Sou tua parte mais dura como elemento de sustentação do teu corpo, mas não sou dono da sua mente, de seus desejos, por causa disso, uso da artimanha e do poder que tenho, que pra mim é sabedoria, de te segurar, quando eu passo a ficar  mole nas tuas junções e armadura esquelética. Se ficando mole, levando você a cair e se arrastar, não consigo lhe deixar parado por muito, imagine se não usasse dessa arte de amolecer. Sou ossos sábios, entendi com o passador do tempo que só amolecendo  por dentro pra lhe fazer entender que tem hora que as paradas às reflexões são necessárias, com isso consigo te parar por fora, te estancar em algum canto do teu ser desobediente, que tá sempre querendo bater no vento que sopra contra  ti.
Acho que meus ossos têm muito ciúme das minhas correrias e buscas e sonhos e realizações. Quer me fazer um João bobo, uma marionete, tem ciúme das noitadas franqueadas quando estou de caso amoroso com uma mulher que ele não acha gostosa ou não vai com a cara. Acho que meus ossos acham que quem tem que gozar é eles. Até já se meteram com o meu pau, dizendo a ele que fizesse e agisse como eles agem, amolecesse também nas horas que não comungasse das mesmas idéias e desejos, nas horas das felicidades estremadas. Essas situações na vida das pessoas são um pecado para a vida que se quer levar até os noventa anos, dizem eles. Apesar do meu pau não ter osso, uma vez ou outra quer acompanhar as ideais dos meus ossos. Parece um pau sem caráter, vai pela conversa dos outros mesmo sabendo que mais tarde pagará  alto preço pelas bobagem que faz.
Tem uma coisa estranha na minha relação com os meus ossos. Parece que eles não me querem ver feliz. Quando rio,  já sinto por dentro do corpo um comichão, são meus ossos agindo pra me fazer retrair e se tornar mais comedido. Outro dia tava eu com os amigos farreando, quando na hora do desfecho do prazer  inigualável, me fez arriar e ficar estatelado sem poder sair do lugar. Tudo amoleceu. Meus amigos ficaram sem saber o que fazer, foi quando tive que acalmá-los, dizendo que com os meus ossos eu me entendia. Daí a pouco fiquei triste, foi quando voltou a endurecer, mais daí a farra acabou, perdi a graça e a calma, senti vontade de pegar uma furadeira, uma serra copo,  esmerilhadeira, moto serra e cortar meus ossos em pedaços minúsculos pra nunca mais fazer feio quando das minhas alegrias.
Como  grande  parte dos elementos do meu corpo também é mole, e ser meus ossos que formam a minha estrutura firme feito rocha, nessas horas fico sem ter como me movimentar. Acabo me comedindo pra que eles acabem com a greve que fazem pra com a minha pessoa quando está feliz.
Acho que meus ossos têm muita inveja de mim. Por que sou uma pessoa solta, sem vínculo psicótico com nada, sem apego, livre, leve e solto no pasto feito um  potro em busca de ração que lhe aqueça o estomago e a alma. Inveja é uma pedra que se atira na direção de quem não se gosta, mas quem recebe não sabe de que direção partiu, isto é, quando não se conhece quem é o invejoso, mas no caso dos meus ossos, não, eu os conheço, afinal nascemos juntos, somos do mesmo espaço, ocupamos a mesma estrutura, vamos no mesmo conjunto pra todo lado, não tinham porque ter inveja de mim, já que aonde vou os levo.
Em varias situações meus ossos me deixam nervoso, é quando se acham o sabichão, e eu o bobão, se acham o Doutor Honoris Causa da sabedoria. Enche o saco: para de beber álcool, toma cálcio, come tal fruta com tal letra, você quer que eu morra antes de você pra ficar por aí gandaiando pelas noites com mulheres,  poesias, se empatufando de proteína animal, criando calo na barriga, desgastando os órgãos internos ingerindo o que não presta como alimento. Respeita Zé! Sou teu e você é meu!
Zé Sarmento

segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Lançamentos do livro GUERREIRA






O QUE É PERIFERIA, BURGUÊS?



O QUE É PERIFERIA, BURGUÊS?
Periferia é um recorte espaço lugar da cidade metrópole em que se encontra os bairros mais carentes ocupados por pessoas  que foram expulsas das proximidades da casa grande.
É lugar recortado por talhos fundos em rosto sofrido por ainda lutar contra o preconceito e as adversidades de uma sociedade conservadora.
Periferia é onde se assenta os casos de necessidades básicas que o Estado rico formado pela burguesia, não soube como dá o pontapé inicial para acabar com as desigualdades sociais e exclusão.
Periferia é aonde mora a gente que lhes serve a preço cômodo.
É o lugar de problemas sem solução pra morador das encostas.
É por aqui que o bicho pega em corpo que quer movimento, quer assento nos ônibus pra viajar pra servir vocês do outro lado da ponte.
É lugar recortado por talho de faca, tiro, necessidades, lugar de ruas cheias de vida nos fins de semana com o som da caranga alimentando a alma, que molha a garganta com cerveja de marca ou vinho barato.
Periferia não é só problema, é solução pras vossas necessidades quando estão com a roupa suja, a casa por arrumar e limpar, a cama por fazer depois de uma transa, as paredes por pintar, um portão por consertar.
Periferia é lugar aonde vos serve quem nela mora e acorda cedo, chegando tarde em casa, sem dar tempo de ter tempo pra sonhar.
Periferia é lugar de esgoto correndo a céu aberto, córregos maus cheirosos fedendo ao que vocês  consomem, é lugar onde se joga fora vossos lixos quando não os servem mais.
Periferia é lugar de poeta, artista, escritor, doutor que sonha por igualdade de condições num Brasil que não os quis até uns anos atrás.
Nas periferias estão a energia da virada de mesa pra um país mais justo. Delas sairão os votos para trazer os políticos honestos pro seu lado, por que estes sempre estiveram do lado de quem não sabe o quê, e seja periferia.
Periferia é brisa na manhã alisando rosto cansado quando sai na segunda- feira para trabalhar em vossos condomínios. Os porteiros de vocês, as faxineiras, os motoristas, manobristas, as 'enfermeiras' que cuidam dos vossos moribundos, os vigilantes, os jardineiros, pedreiros, marceneiros, todos dormem em alguma periferia, e acordam cedo para não deixar faltar o café da manhã nas vossas mesas.
Periferia é onde se nascem as crias de um futuro incerto, mas que serão certos que irão vos servir, mesmo sabendo que pagarão pra eles salários miseráveis.
Periferia é lugar que cresce aqueles que no futuro irão fazer tremer as vossas carnes, se o Brasil não descobrir que nela precisa investir muito mais que aí, na educação, cultura, esporte, transporte, moradia, saneamento, renda, saúde.
Periferia é lugar que estão às armas que os fazem tremer de medo quando apontadas para vossas cabeças, pela vida toda vocês negarem  um pouco do que possuem, por os terem feitos escravos das vossas ações e enriqueceram os expulsando para lá.
Periferia é onde mora a descendência de escravos, de nordestinos, pretos, índios e brancos pobres que não tiveram oportunidade no campo de atuação que requer a educação.
Periferia é lugar que mora gente que tem sentimento, não de culpa, de culpa teria que ter vocês, por explorá-los até os ossos, e terem enriquecido por sonegar impostos que poderia ter melhorado a situação.
Periferia é lugar que nem os piscinões dão jeito nas enchentes, nos córregos que se enchem levando nossas vidas, como vocês também os levam, os fazendo adoecer de tanto vos servir.
Nas periferias de são Paulo e do Brasil é onde mora gente que não dá risada quando perde um ente querido, chora pelo sentimento da perda, porque é coração, ação, também razão quando é necessário botar  fogo na engrenagem de uma sociedade medíocre que recria seus dramas alicerçando-os através da arte da escrita, da pintura, do cinema, da vida vivida intensamente.
Viva as periferias de todo mundo que busca um acento nas costas do planeta para usufruir do que ele é capaz de produzir.
Zé Sarmento

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

LÍTEROPALESTRA DE ZÉ SARMENTO CEU FEITIÇO DA VILA




Encontro com alunos de escola pública, CEU Feitiço da Vila. Agradecer aos alunos que se comportram muito bem, aos professores que acompanharam a jornada e a Ana Paula Miguel da biblioteca. Foi da hora receber duas turmas do 9° ano, 70 alunos. Todo estudante de escola pública precisa e merece um escritor no pé do ouvido.
Aê Secretaria da Educação Estadual, DRE Campo Limpo, Secretaria Municipal de Cultura, vai deixar faltar incentivo a leitura, através do próprio escritor periférico, a esses jovens que mais precisam de incentivo a leitura?
Distribuí livros meus, gratuitamente, porque na verdade eles veem pra cima querendo levar pra casa pra ler.

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

FOTOS LANÇAMENTOS GUERREIRA















Meus queridos amigos guerreiros e guerreiras com o meu novo livro GUERREIRA.
Saraus da Brasa,Clamart, Cooperifa e muito mais...


quarta-feira, 26 de agosto de 2015

GUERREIRA


Este é mais um lançamento do escritor Zé Sarmento, GUERREIRA. Romance. Drama.

Maria do Socorro é vítima de violência doméstica, mãe de quatro filhos pequenos. Espancada pelo marido junto com os filhos, um dia toma coragem em sair para procurar ajuda do poder público. Decidida, acorrenta os filhos ao próprio corpo para dar prova que eles são suportes importantes da sua luta e chamar atenção da sociedade para seu problema. Este livro quer trazer à discussão a violência contra a mulher, fazer que as leis saiam do papel e caiam na real. 

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Líteropalestra Oficina Literária de Zé Sarmento-Escritor

BIOGRAFIA
José Marques Sarmento (Zé Sarmento) morador da periferia da zona sul de São Paulo. Trabalhou como bóia-fria até aos 19 anos. Pais analfabetos e falta de escolas, o fez se alfabetizar somente aos 14 anos. São Paulo foi à saída. Se fez profissional de iluminação do  audiovisual em longa-metragem, curta e publicidade. Casado, pai de quatro filhos. Licenciado em História com bolsa do PROUNI, depois de voltar estudar aos 50 anos. Escritor de oito livros. Um Homem Quase Perfeito; A Revolução dos Corvos; Urbanóides-Um Caos Paulistano; Paraisópolis-Caminhos de Vida e Morte; O Sequestro do Negativo Exposto; Bixiga-Um Cortiço dos Infernos, Ângela-Um Jardim no Vermelho; GUERREIRA. Declama seus textos em saraus. Faz palestras em bibliotecas públicas, escolas públicas, bibliotecas, ONGs para incentivar a leitura, o livro, a literatura, o conhecimento. Está em fase de lançamento do 8º romance, GUERREIRA - 2015.


quarta-feira, 29 de julho de 2015

Líteropalestra de Zé Sarmento II - Arrastão Campo Limpo



Líteropalestra do dia 27/07 no ARRASTÃO Campo Limpo, a segunda do mês, pra alunos do período da tarde. foi da hora! Mais de 80 alunos interagindo com o livro, aleitura, literatura, e POESIA. Agradecer aos coordenadores Francisco Cruz, Karina, Priscila, ao professor Hugo que esteve com sua turma escutando um escritor no pé do ouvido.
"Todo estudante de escola pública merece um escritor no pé do ouvido."

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Líteropalestra de Zé Sarmento I - Arrastão Campo Limpo




Mais de 100 jovens com disposição pra mudar a cara do Brasil, começando com palestras de um escritor no pé do ouvido, deles.
Manhã fria esquentada pela palavra de incentivo a leitura, livro, biblioteca, estudo, conhecimento. Jovens entre 15 e 18 anos da perifa da zona sul, Campo Limpo. Fazem cursos profissionalizantes. Estudam num período em escolas públicas normais, noutro período do dia, enfrentam professores que os prepara para o mercado. Que maravilha. Todo estudante de escola publica precisa de um escritor no pé do ouvido. Zé Sarmento.

quarta-feira, 1 de julho de 2015

Fotos Líteropalestras de Zé Sarmento





OPRESSOR


OLHO ABERTO NO OPRESSOR
O opressor de hoje tem o mesmo instinto assassino de antigamente.
Não se contenta só em passar por cima do nosso corpo com fuzilaria pesada.
Ele quer também esmagar o corpo da nossa áurea psicológica.
O opressor que nos esmagar na caminhada.
Extrair nossos ganhos sociais da carne e deixá-la pele.
Quer nos deixar com  ossos chacoalhando.
Nos botar perdidos numa noite de zumbis pela cidade.
O opressor tem medo de perder parte de seus ganhos.
Investir num novo iate explorando nosso suor derramado às traças.
Faz parte do seu projeto.
Investir numa mansão em Beverly hills, Manhathan,
Foder e cheirar numa praia paradisíaca da costa do pacifico.
É isso que completa o pensamento do nosso opressor.
O opressor  quer nos operar arrancando o nosso fígado.
Quer ir fundo ao nosso coração. Esmagá-lo.
Quer chegar o opressor no mais fundo  do nosso cérebro.
Emburrar os nossos neurônios, os nossos sonhos.
O opressor é radical, violento, é muito rico, poderoso.
Possui  muito no seu nome do capital mundial.
Não vamos nos curvar a ele, oferecer o rabo a ele.
Quanto mais o opressor nos ver rindo, nos odeia.
Quanto mais o opressor nos ver discutindo com sabedoria.
Às causas que só ele sabia.
Mais nos odeia.
Fazer o opressor morrer de inveja cercado na sua mansão.
É a missão.
A nossa liberdade não tem preço.
À vezes pela violência se conquista.
Porém, vamos usar também de palavras sabias pra calar sua ira.
O opressor de direita, conservador, fascista.
Vai morrer muito  infeliz.
Nos vendo muito felizes sobrevivendo apenas com o necessário.
Cantando nosso refrão popular.
Bebendo muita cerveja nos carnavais pelos morros e cidade.
Vejo nosso algoz no hospital gastando a rodo.
O que conseguiu juntar com a nossa exploração.
Indiferença e desprezo ao opressor!
Antes que ele nos esmague com o seu rolo compressor.


ProSia de Zé Sarmento

quinta-feira, 28 de maio de 2015

ONDE ANDA MINHA TRIBO?

Cadê a minha gente?
Cadê a minha descendência?
Por onde anda meu DNA?
Por gentileza, apresente a minha tribo.
Preciso me enturmar, tomar um banho de relacionamento.
Convencer-me que sou capaz de manter uma amizade prolongada.
Quem sou EU, afinal? A quem pertenço?Tenho algum parente?
Preciso encontrar a minha tribo.
Ando só cavando minha estrada.
A minha tribo foi esfacelada.
Foi queimada pelo calor da explosão da mente de um senhor de engenho?
Desapareceu porque se meteu em luta contra a arrogância do poder?
Foi numa noite de trevas que a minha gente se foi?
Foi num dia de tocaia que a minha tribo acabou?
Preciso da minha tribo!
Preciso vestir os panos da minha tribo.
Pintar meu corpo com as cores da minha tribo.
Pentear-me como a gente da minha tribo.
Beber e comer  alimento da minha tribo.
Falar a língua da minha tribo.
Pensar o que pensa a minha tribo.
Ler o que ler a minha tribo.
Escrever o que escreve a minha tribo.
Preciso da minha tribo pra dizer que pertenço a alguém.
Pode bater tambor, tocar agogô, sanfona, gaita.
Religião de qualquer fé também pode ter na crença.
Sozinho não consigo me relacionar.
Tem que haver um lugar pra me caber.
Cadê o cemitério da minha tribo, o jazigo, os ossos, a caveira inteira?
Cadê os bens que deixou a minha tribo?
As casas, as fazendas, as contas bancárias?
Os registros da minha tribo a história não se preocupou  preservar.
Que pena!
Cadê a minha tribo?!

Zé Sarmento

quinta-feira, 14 de maio de 2015

INFÂNCIA








AQUI TEM HISTÓRIA - INFÂNCIA
A criança e jovem que existiram dentro de mim, sobreviveram em  tempos de vacas magras e gordas.
Era o nordeste nas áreas das intempéries pregando peça no homem explorado e esquecido envelhecido pelo latifúndio.
Vivi nos campos irrigados da planície num tempo.
Noutro em terras de vegetação da caatinga deserta nas estiagens.
Era o nordeste em chama queimando o intestino do homem pobre do campo.
A caatinga pregava a maldita seca, muito dramática para quem lá vivia.
Noutro tempo era o nordeste em aguaceiro.
Fazia rir o homem como os rios que se enchiam.
O inverno fazia uns continuar.
A seca fazia uns se retirar. FUI UM DELES.
Nas enchentes das invernadas, peixe era  fartura, sorria ao alimentar gente de tripa vazia.
Nas secas que rachavam o chão numa arte desalinhada,
carne de gado com bicho tapuru em luta com urubus, trazia fartura.
No homem crescia no semblante a vontade de seguir adiante.
Chão pra fazer seu roçado recebia com fúria a foice e machado derrubando flora. 
Filhos aos montes ainda em formação acompanhavam o agricultor.
Sempre nascia mais em cada juntada de carne em brasa para o amor.
Nas enchentes inigualáveis, no aguaceiro da peste do açude despejando o majestoso fluido no rio Piranhas, vinha na tarrafa apanhari, piau, curimba, 
cascudo, muçum, pirarucu, tucunaré.
No landuá caia peixe da lama. A traíra era atraída com isca de filhote de rã.
No anzol, peixe faminto tremia na linha do menino em busca de alimento.
Minha fome era saciada com a carne de peixe de escama, de couro.
Piabinha frita ao sol.
Era ouro ter o que comer pra não cair de paralisia infantil.
Peixe grande se debatia antes de  pancada na cabeça com pau de aroeira.
Sabia que ia pra fervura na trempe do fogão a lenha de Dona Francisca.
Alimentava boca espumando pela fome quase matando.
No roçado não tinha pra ninguém, esse aqui era menino muito labutador.
Afoito. Desbravador de mato brabo.
Dores de vez em quando o pegava. No interior.
Sonhos distantes de pegar com mão de ferro e trazê-lo pro prazer de estar vivo.
Era alumiado por sol medonho nos dias de todo dia.
Nas noites era a lua a poesia.
A enxada endiabrada, a foice envenenada,
o machado drogado por erva da mata calcinada,
extraia desse caboclo menino, um arcabouço de homem feito.
Cacho de banana nas costas. Uma manga na boca.
Feixe de palha de arroz no lombo.
Saco de farinha na cabeça.
Sobrevida me vinha,
quando sonhava comer bife a cavalo, parmegiana,  milanesa.
Esperança  de acontecer,
quando virasse retirante,
e desse de cara com  Sum Paulo pra trabalhar no metrô.
A partir desse dia começar sofrer de outras dores:
As da saudade, da discriminação, do subemprego, da solidão num quartinho de pensão, onde os livros eram os amigos. Lá no Bixiga. Num cortiço dos infernos.