Calma, camarada Koskovisk, o canhão da revolta é ruim
pra sociedade lúcida, deixa horripilante seus dias fatídicos.
212-Da Vinci-
Agora, senhora, quer me ver sorrir, que me ver saltar e muito mais fazer, até rezar dobrando o joelho, quer me ver tão rico, cheio
de vida e ousadia para seguir os dias, tão gordo, tão farto? Mim faça de
cidadão criado por ordens e deveres, beleza do meio, rapaz do seu elo ligado, um
menino com chão firme para pisar e que tenha pão farto pra degustar.
213-Mona Lisa-
Não corra de mim, Senhor pintor, quero fazer minhas mãos
encher-te de tocar por carinho bondoso, meu calor iluminar-te de odor e minha
vontade de te amar encher-te de amor, assim me encontrarás cheia de vida e têmpora
brilhando a qualquer sol existente ou faltante.
214-Da Vinci-
Não, antes me ouça com atenção, quero que você permaneça
como nos dias passados, os primeiros desse atelier, depois das dores sofridas
causadas pelo bicho homem sem cor, veneno de branco, que mesmo sem ser aceito
pelo de cor áspera, ainda causa muita dor.
215-Mona Lisa-
Pra isso me tire da guerra dos falsos dias, da
greve das classes baixas, das notícias ferroando a mente nos mais lúcidos
momentos. Faça vir a minha frente os dólares que dominarão o mundo contemporâneo.
Não roube o último dinheiro que me restou. Não me negues um PF ao menos, aquele
que algum dono de botequim me negou,
dizendo que tinha em sobra, mas que não ia me dar pra não me viciar. Ponha
minha cara para fora do anonimato e me resgate do poço fundo das incertezas.
216-Da Vinci-
Dou tudo isso, mas se você não negar o sapato que o
dono da fábrica um dia me negou, dizendo que já tinha mandado sua parte para
instituição de caridade e que não lhe encha o saco, que está prestes a estourar
e sair voando feito uma bala e pegar em quem de longe o espia para retirar o
que é seu na mão grande.
217-Mona Lisa-
Casaco que um dia ele tirou de alguém nos desgoverno, de
alguma repartição, de alguma instituição dessas modernas, ou então foi roubado da euforia que o time negou no final do campeonato, perdendo para
um fraco adversário que até o admira. Me dê tudo isso, senão te jogo no seio
dos banidos, dos moleques varridos que usarão por muito tempo uma tal de FEBEM,
por estarem perdidos pela passagem discreta e direta pelo ponto final do último trem periférico.
218-Da Vinci-
Não quero que me falte toda força capaz de girar os
substantivos depois dos verbos e que seja decepada a cabeça dos trouxas, pois
no meu pé ninguém vai pisar.
219-Mona Lisa-
Que é de sola, de borracha resistente, do gigante
Pau-Brasil, da árvore Jacarandá.
220-Da Vinci-
Sabe por quê? Não sabe, né? Digo, é porque minhas
mãos não vão pedir esmola, elas desabrocharão para a glória de todo dia na certeza
do sempre ter o que comer.
221-Mona Lisa-
Do nascer.
222-Da Vinci-
No bom vestido.
223-Mona Lisa-
Do beber.
224-Da Vinci-
Um bom uísque.
225-Mona Lisa-
E depois tirar bebê.
226-Da Vinci-
Pra deixar de derreter.
227-Mona Lisa-
Sem deixar transparecer que a linda anda na moda, anda
na linha estrema do bem viver, retirando da melhor loja dos shoppings, a cobertura
da moda.
228-Da Vinci-
Nada de dizer que tudo será egoísmo de dias contados o
que virá para aquela gente de pires na mão pedindo dinheiro aos estrangeiros
com a gordura financeira de alguns saindo pelos cantos da boca.
229-Mona Lisa-
Está lá na garagem o carro a pagar trancafiado por
solda bruta numa caixa de tradição, por ser assim que vão ficar devendo ao
patrão que lhe deixou na mão por ter pisado de montão por cima de sua
comiseração. Sendo assim que irá acontecer, irá chorar e ficar sem credito na
mão.
230-Da Vinci-
Garagem difícil de ladrão entrar irão gradear, pela guarda
vigilância todos ligados nas noites das madames agonizando com doença de cama.
231-Mona Lisa-
Eu quero ver algumas rebolar nas noites de
sonambulismo e ter acesso ao orgulho reprimido. Afirmo que irão sair de cima da
minha sombra, pois sou sobra frágil e frigida, não tenho mais direito a nenhum
prazer.
232-Da Vinci-
A futilidade lhe tirou a harmonia das células viris
que fazia questão de com ela estar, e nenhum britador a fazer mais gozar.
233-Mona Lisa-
Preciso tomar gemada pra encontrar minha tara perdida,
meu corpo não tem sentimento é apenas uma semente que não quer renascer,
falta o adubo do sêmen para fazer-me viver.
234-Da Vinci-
É calado, também não fala nem geme, cai no abismo do cúmulo, serão os tempos futuros na caçada aos pokemons.
235-Mona Lisa-
No ontem dizem que era pior, tinha a morte de porta em
porta.
236-Da Vinci-
Me enganei por demais nas noites sonâmbulas, pelas
drogas medicinais e não medicinais, os calmantes me deixaram sem a harmonia do
amor.
237-Mona Lisa-
Por isso eu sofro e choro piedosamente. Fico triste em
ver triste crianças falando com a boca bem cheia de língua nas noites de farra
que se perverteram compenetradas com a penetração por dinheiro, para comprar o
que comer e vestir.
238-Da Vinci-
Caíram mesmo no abismo do cúmulo, no abismo do túmulo
que mais tarde serão encerradas.
239-Mona Lisa-
Sai de perto de mim, Da Vinci. Não sou bombeiro para
meter fogo e apagar.
Não vou mais acender a chama do seu amor e depois sair
vaiada por não poder continuar a atiçar. Não vou entrar na sua nem cavar o túmulo
da minha própria sepultura. Se eu entrar aí, nunca mais sairei, porque nunca
mais me soltarás.
240-Da Vinci-
Você não sabe o que está perdendo. Também não preciso
de ninguém bruto perto de mim. Tem que haver carinho, afago, mimo pra depois
entrarmos um no outro.
241-Mona Lisa-
Tem que haver uma espera, um apoio, uma linha de
convergência mútua. Nada de entregar minha grana, minha fama de avião. Se não
presta, não me satisfaz, dinheiro não leva.
242-Da Vinci-
Se for assim, te pergunto. Por que as madames zombam
dos guris que ejaculam a distância, que querem levar sua grana, sem deixar um
pouco de seus movimentos desenhado na
mente, na zona erógena?
243-Mona Lisa-
Respeito com os direitos legais das mulheres da zona,
Da Vinci.
244-Da Vinci-
Polícia, polícia, homem da lei, vou viajar pra bem
longe pra ver minha cria exposta nos
museus do mundo, pra que você prenda a
minha criatura por ela não está querendo viver mais com o criador. Levarei sua
imagem na esperança perdida de minha vida que foi fula.
245-Mona Lisa-
Não me entregue para aquela gente, meu melhor Criador,
o mais famoso de todos. Não me faça resto de soro de entrar na veia de doente à
beira da morte em hospitais alquebrado. Se isso acontecer de ser, vou viajar na
carona dos sonhos e nunca mais volta à realidade.
246-Da Vinci-
Você não presta, Mona Lisa, abriu uma fresta de
esperança no meu peito agora quer me largar. Não sou do tipo que vai gostar de
estar exposto iluminado por facho de luz amarelo igual você vai viver pela vida
toda. Ainda te digo, fugirás com o que eu tenho de material e espiritual deixando meu amor na sarjeta esperando as
patas dos monstros que os governarão em frente a faculdade São Francisco.
247-Mona Lisa-
Não me deixe tão maluco. Se for assim matarei de graça
só pra ver o corpo ser fulminado no chão da amargura e começar a se debater
sofrendo as dores da sorte por ter morrido como revolucionário, e não feito um
passarinho em seu ninho de quentura preparado pelo capim da cultura ocidental. Eu
deixarei um corpo no chão, nem que seja um só, pisado pela bosta que saem dos
cavaleiros do cão.
248-Da Vinci-
Policia de verde, sei que você sentiu o meu pincel,
não me pagou porque não quis, dinheiro você tem, recebe propina dos marginais e
traficantes desleais, pardos pela cor da raça.
249-Mona Lisa-
Não fale desse jeito com eles, Da Vinci, antes de tudo
os tire do lixo, os punha no luxo que é o que todos sonham, assim dirão e farão
as novelas das oito que será o elixir do divertimento pro povo daquele país
carente de entendimento.
250-Da Vinci-
Entre já e sai já do meu espaço focal, venha e vá
assim estará sempre presente e ausente. Do jeito que vai, a relação não agüenta,
as brigam ficam iminentes.
251-Mona Lisa-
Preciso jogar alguma bola pro ar. Tenho o direito de
soltar todos os papagaios que estão presos nos pavimentos dos falantes e não
farsantes que se desalentaram ao irem presos em pleno sonhar de outubro.
252-Da Vinci-
Eu vou é quebrar um grande ovo e ver se sai dele uma
dúzia de pintinhos galados há alguns meses. É a lei da produtividade dos tempos
de agora. Se não produzir, será renegado ao estado cadavérico de quem está morto.
253-Mona Lisa-
Eu também preciso agir, Da Vinci, como aquele grande
rei, o rei dono do cinturão das leis que penaliza a competência da
sobrevivência dos pobres coitados que
pendura a conta pro final do mês, chegando esse dia de não ter como quitar. Se
não for do jeito que eu quero, vou jogar açúcar, quero dizer merda na produção
dos dias que todos inventam e sair vendendo pra todos com caras de bobo, e dar
uma de boba também, pra ver se me safo sem pagar a ninguém, dizendo que tudo
que eu vendia era coisa feita de verdadeiro caviar russo.
254-Da Vinci-
Vou também ser forte, Mona Lisa, fazer um míssil sair
voando fazendo piruetas no ar da minha imaginação e ir de encontro a aquele
avião que transporta os grandes que mandam no mundo de todos os tempos. Aí eu
quero ver aquela gente poderosa sair pela rua se descabelando gritando, salve meu
filho! Salve o meu filho! Ele é bom e não tem cara de jirico como a maioria desse
lugar tupiniquim nanquim cáften, correndo pelo chão perfumado da dama do
general.
255-Mona Lisa-
Homens, veja como sofro, sou um pequeno ovo chocho
depois de ser considerado um eldorado,
sem cama pra esquentar o saco de dormir, sem quintal pros meus filhos brincarem,
sem varal de estender as roupas da fortaleza do poder.
256-Da Vinci-
Conto que hoje sou um homem desiludido pela ferida que
os tempos modernos me fez. Estou com os olhos sangrando sofrendo as batidas no
coração, ele não resistirá por muito as
grandes emoções.
257-Mona Lisa-
As emoções não passaram por aqui por esse peito,
sangrando pela falta de realizar o que tinha que ser feito.
258-Da Vinci-
Acho que vou perder a voz e morrer com a ferida
refinada pela voraz forma de consumir o pudim do desenvolvimento, depois de morto,
ponho a boca para algum santo do momento beijar e dar o perdão pelos pecados
consumados no decorrer da minha produção.
259-Mona Lisa-
Porque não pede para ele te envivecer, fazer da tua
cara um santo homem e pregar nas cruzes
das igrejas mais freqüentadas pelos menos desafortunados e madrugadores? Assim
será uma imagem imaculada e será velado todos os dias de toda hora do
sofrimento interior, pelos pagadores de promessa.
260-Da Vinci-
Eu não mereço o clamor que virá daquela gente que será
os mais fervorosos católicos, depois de tanto pecado cometido e de ter vivido
um caos mental e comido a minha principal peça para a criação.
261-Mona Lisa-
Quem sabe não cremarão o teu corpo e te amarão até morrer
e virarão santos alguns pelos sofrimentos que passaram pela falta mínima de
tudo que tem um ente pra sobreviver.
262-Da Vinci-
Não me faça pensar uma coisa dessas. É covardia massacrar
a cara de quem será perdoado pela fé divina. Você com esse papo de não sei quê,
parece mais uma lamparina querendo acender a noite como se fora dia. Sai de mim
agonia de mulher mal-amada, sai pela tangente dos verbos e adjetivos das
palavras e frases de efeito para pôr em evidência o teu conhecimento literário
e linguístico.
FIM
Aqui jaz essa viagem lúdica, descompromissada com
qualquer gênero literário, que me levou a escrevê-la num quartinho do Brás em
1979, com um ano e pouco de São Paulo. Era muito tímido, vindo do auto-sertão
da Paraíba, Sousa, com muita dificuldade de relacionamento, querendo dizer
alguma coisa, saiu esse texto, vindo a bailar no que queria dizer, carga
poética comum a quem nasce naquelas terras e que fora criado ao som de cantador-violeiro,
sanfoneiro, ritmistas de pandeiros e zabumbas, ao som dos relinchos dos jegues
e berros das cabras, que davam fuga certeira para moleques arteiros.
ZéSarmento