AQUI TEM HISTÓRIA - DA ARTE EM SUM PAULO
Poucos retirantes nordestinos como eu teve a oportunidade de frequentar e estar no meio do povo da arte desde o primeiro ano (1977) em Sum Paulo.
Já cheguei chegando aqui com o propósito de tentar fazer filmes, expressão da arte que entrou como furacão na minha paixão de criança e adolescente. Fazia o diabo, pregava estripulias pra assistir as fitas que passavam no cineminha da minha vila operária nos fins de semana. Até entrar pelo buraco arrombando porta, nos circos pulava cercas de arame farpado, enquanto o vigilante estava distraído paquerando uma mocinha que gostava de dar atenção pra quem era de fora e estava de passagem.
Aconteceu de eu chegar aqui ao viajar com um irmão mais velho e receber seu apoio. Fiquei uns 5 meses na casa de quarto e cozinho dele na cidade de Santo André, momento em que dormia embaixo da mesa da, Casas Bahia, na cozinha de piso de cimento vermelhão forrado com colchonete. Logo saí em busca de emprego no centro. Ao descer na estação da luz do trem que ainda hoje faz o mesmo percurso, peguei a Avenida Cásper Líbero, entrei na Prestes Maia, momento em que divisei com uma placa num escritório de uma construtora oferecendo emprego para trabalhar no metrô praça da Sé. Pronto. Feito a ficha, as quatro operações de conta e escrever um texto solicitando o emprego e o porquê, fui contratado pra ser auxiliar de almoxarifado da obra com CLT. Mais uns meses estava matriculado num cursinho de cinema na rua Riachuelo. Desse cursinho depressa dei linha para o campo prático: trabalhar como assistente de tudo e mais um pouco nos sets das produções dos filmes que o dono do cursinho produzia em conjunto com produtoras da boca do lixo do cinema paulista.
Nessa pegada, e já morando na região central, precisamente num cortiço no bairro da Bela Vista, Bixiga, comecei a ver tudo de cinema e de teatro do início dos anos de 1980. Além disso, tinha como extensão da minha morada no cortiço dos infernos, a Biblioteca Mário de Andrade e todo o entorno da região central, como o teatro municipal em que frequentava quando o preço para ver espetáculo era popular, estava eu lá no poleiro mais alto e distante do palco, mas mesmo assim me fazia sair do lugar comum e me deslumbrar por amor e paixão por toda arte e suas expressões. Essa foi a faculdade que, em princípio, proporcionou minha graduação em toda expressão artística que podia estar presente como alguém da audiência. Reuniões políticas e debates do PC do B sobre a Palestina com os irmãos Rabelo, no Bixiga, acompanhar o nascimento do PT e suas lutas nas Diretas Já, não ficaram de fora da panela cultural que mastiguei com muita calma e engoli com pressa, pois era um tabaréu cabeça chata que tinha apenas a oitava série e sentia necessidade de viver tudo aquilo que me faltou no tempo d'eu criança e jovem sobre a arte mais elaborada na minha querida e paradisíaca São Gonçalo, Sousa, PB.
Cheguei do sertão para a metrópole paulistana apenas com os tímpanos ainda vibrando com a zoada da sanfona, dos pandeiros, zabumbas, triângulos, e em alguns momentos nas casas de alguns moradores, repentistas com seus motes pra lá, motes pra cá, dedilhando violas, e a grande saudade de ter migrado e deixado para trás umas namoradas em que as bocas e os peitos foram amassados com a energia que tem quem que está recebendo descarga de hormônios do crescimento, ganhando penugem nos ovos, os peitos crescendo e as punhetas sempre presentes. Hoje sou o que sou pelo meu mundo barroco sertanejo e da cidade grande terem me moldado. @zesarmento