domingo, 26 de setembro de 2010

MORTE NA CASA DAS ROSAS


MORTE NA CASA DAS ROSAS


Não resistiu a tanta performances mirabolantes em construção que saiu dos traços da sua criação.
Era hora de se revoltar com toda mazela que assistia de onde estava, de partir pra cima com a fúria dos endiabrados e pôr a lâmina para perfurar um a um sem piedade aparente os intrusos da sua residência.
Nunca viram tanto ódio em pessoa de índole tão pacata, que sempre empregou nos gestos, suave tempero de educado senhor vindo da aristocracia paulistana.
Levava a lâmina embainhada de fio amolado e ponta afiada no esmeril da esperança em ver acabado sua vingança sem muito tardar. Enfiada à cintura segura pelo cinto, escondida pelo meio da revolta que via e sentia, levando na cara também uma careta-máscara que exportava pesado terror a quem o divisava
Não ia deixar a casa dos sonhos, construída em grande área arborizada, possuindo trinta espaçosos cômodos em estilo arquitetônico francês, evidenciando fachada de grande vitral colorido decorando hall de entrada. Sabia que sua criação atraia e alegrava todos os visitantes, por se emergir de prazer, não faltando o mesmo sentimento quando se deparavam com o espaçoso jardim inspirado no famoso palácio Versalhes, ganhando as raízes dos roseirais, energia suficiente de terra sempre adubada para encantar os românticos e apaixonados com suas flores viçosas.
Não viu a sua cria robusta e bem acabada recebendo as pilastras e fachadas e escadarias, o estilo clássico de vanguarda, que se encontra fincada em rico solo, receber os amigos dos descendentes em festas regadas ao melhor vinho e champanhe e uísque escocês, claro, sem passar pelas orlas Paraguaias para serem rebatizados.
Estendeu dias na planificação dos desenhos da residência, nas horas em vagar dos projetos arquitetônicos de responsabilidade sua de obras municipais paulistanas, sonhando em dar a filha uma moradia digna de sua casta descendência, riscando e amassando pequenas plantas com traços que ganhava os papeis e que não achava que era o que devia ser os móveis e objetos de decoração, tentando dar forma nos traços criados nas escalas estudados na faculdade de arquitetura.
Não gostava do que via ser apresentado e representado sem inibição pelos poetas que pela casa eram escolhidos para os lançamentos de livros, pelos artistas que faziam suas obras e expunha em instalações de vanguarda.
Achava que as obras que lá freqüentavam eram textos criados sem conexão com a realidade dos tempos atuais e da sociedade.
Para dar andamento ao que se dispôs a fazer, que por muito tempo o fez matutar de como deveria agir, surgiu entrando pela larga porta principal já com a faca empunhada em riste, num ínfimo andamento em que um autor lia um poema de criação própria, gesticulando para todos os cantos e para todo os ventos.
A faca desinibida fora retirada da cintura num só solavanco de endiabradas mãos de homem rude ao pisar no último degrau da subida, e entrou pela parte do corpo que poderia encontrar o melhor órgão que existe para fazer, por ocasião, parar de bater e dar os últimos suspiros os pulmões. Encontrando o coração, foi lá que se alojou a ponta afiada e parte da lâmina vindo a cortar a veia aorta. Puxando-a para si e já de olho em outro autor, deixou-se cair nas escadarias o berrante e delirante homem poeta, vindo a ficar esguichando no piso de mármore o vermelhão de dentro de si.
Já correndo ao outro grande da escrita que fazia sua performance em sala exígua ao grande hall de entrada, chegou a tempo de encontrá-lo ainda pelo meio do poema que achava que era sua obra prima, quando num lance de trepides instantânea, fez o braço com toda força dos tendões, levar a lâmina de encontro ao abdômen.
Um grito estridente se ouviu ecoando por toda área da grande avenida, vindo a se despregar das paredes, algumas pinturas de grandes artistas do passado, pelo medo de serem também confundidos como autores contemporâneos. Arrastando a lâmina, tripas saíram deixando o oco da barriga que guardava os intestinos. Grande obra de arte acha que criou fazendo aquele intestino se expor como obra de arte com cores berrantes.
Depressa chegou a outra sala com o povo indo atrás achando ser parte de uma peça encenada com a maestria da veracidade. Nessa encontrou o autor recitando, isto é, gritando a última estrofe do seu épico poema. Encurralado entre o encontro de duas paredes, ficou sem saída na ampla galeria que se achava sob temperatura do ar condicionada, que expunha algumas obras também contemporâneas, formando um mosaico de muitas cores e estilos.
Pinturas clássicas, neoclássicas, modernas, primitivas, renascentistas, barrocas, rococós, românticas, impressionistas, cubistas, expressionistas, futuristas, surrealistas e pop arte, derramavam lágrimas pelo semblante rosto, por saber que, em outras salas, havia uma exposição e instalação de arte contemporânea de autores que se achavam o máximo.
Os visitantes davam ao momento movimento de êxtase com o que assistiam, e de certo modo, estupefatos uns, outros nem tanto, por ser de sentimentos diversos todas as gentes.
Nos infernos ou no céu, já prestavam juramento sobre as mentiras que empreenderam no decorrer da vida, ou as pendentes verdades que tenham neles existidos, os gênios defuntos já entregues a branquice da cor do corpo de quem perde a vida terrena, tendo-os muito mais dificuldade em explicar do por que se interessar tanto em ser chamado poeta, artista, tanta gente vindos de casta burguesia refinada.
Correu o encurralado poeta que deixou de ser por um instante, por ter dado um drible de corpo no enfezado e agora assassino arquiteto com a faca ensangüentada na mão. Saiu em busca de proteção tentando fugir de mãos ignotas, protegendo no peito o filho da sua criação literária. Na fuga acabaram visitando algumas salas, vindo no decorrer da perseguição de quem queria atacar e de quem queria fugir, a destruir as instalações dos artistas que gritavam com as mãos na cabeça desesperados pedindo que não destruíssem o que criaram com tanto sacrifício tendo-os muito mais sacrifício arranjar lugar para expor.
Destruída a arte contemporânea, morto o último perseguido com uma facada nas costas, a platéia visitante da casa das artes começou a aplaudir a encenação, mas ao mesmo tempo começando a fugir quando caiu a ficha, pelo aparecimento de grande aparato de policiais armados para prender o assassino.

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